Viagens

“Maria vai com as ostras”, no Ribeirão da Ilha

Sempre que estou na Ilha de Santa Catarina, não deixo de ir ao Ribeirão da Ilha, uma das freguesias antigas e mais bem preservadas da herança açoriana; fica localizada no sopé do morro mais elevado, na orla do mar. Para lá chegar, vale a pena percorrer de carro, a velocidade reduzida, uma estrada calcetada e cheia de “quebra-molas”. Os vários anúncios de restaurantes preparam-nos para o que vamos encontrar nessa baía abrigada – dezenas de fazendas de ostras. A freguesia orgulha-se de produzir 92% da totalidade das ostras do Brasil.

Quando chego ao centro do Ribeirão, parece-me estar a entrar numa aldeia alentejana. As casas com barras azuis, amarelas e de outras cores fazem-me lembrar a minha infância. A igreja, inaugurada em 1806, com seus altares em talha dourada e pinturas antigas, é dedicada a Nossa Senhora da Lapa e constitui património nacional. Ao lado dela, encontra-se um pequeno império onde se celebra a Festa do Espírito Santo, testemunho do povoamento açoriano.

No Ribeirão, uma visita à Pousada-Eco Museu em muito nos elucida sobre a história local. O proprietário, Professor Nereu do Vale Pereira, transformou o casarão da família num pequeno hotel e expõe, nalgumas salas, ferramentas agrícolas, mobiliário, cerâmicas e muitos outros objetos que recolheu, e contam a história da vinda dos portugueses. Alunos das escolas públicas da ilha ali aprendem sobre os primeiros povoadores do século XVIII, consultam a biblioteca e participam em atividades lúdicas.

Se continuarmos de carro, sempre junto ao mar, a estrada termina na Caieira da Barra do Sul. Aí surge-nos uma alternativa: caminhar numa trilha até à Ponta dos Naufragados, em zona florestal preservada, ou contratar um barqueiro que nos leve à praia do mesmo nome. Já fiz a trilha várias vezes e sempre achei que vale a pena descer e subir pedregulhos, saltar troncos quebrados de árvores e atravessar pequenos riachos. Leva cerca de uma hora para percorrer uns quatro quilómetros e alcançar essa praia isolada numa pequena enseada, ladeada por um farol.
O nome da Praia dos Naufragados foi atribuído a este lugar como lembrança do fatídico naufrágio, em 1753, de duas embarcações (sumacas) que levavam 250 açorianos para o Rio Grande do Sul. Devido a grande tempestade (“forte pampeiro do vento sul”), ali pereceu a maioria, após viagem tão morosa e difícil, sem ter usufruído da alegria da chegada. Salvaram-se apenas 77 pessoas.

A praia isolada dos Naufragados é muito calma, boa para mergulhar e descansar durante algumas horas. Nela podemos admirar “oficinas líticas” (centros de interpretação) que nos transportam a tempos pré-históricos. Há, geralmente, um barqueiro que nos pode levar de regresso até à Caeira da Barra do Sul. Com sorte, algum golfinho que por ali se encontre, delicia-nos com a sua companhia durante parte do percurso. No caminho, dá para admirar as ruínas da antiga Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição, na ilha de Araçatuba, a pousada da Ponta dos Papagaios, ponto turístico muito afamado, e, ainda, o longo areal da Praia do Sonho, do outro lado da baía.

No final da tarde, é quase obrigatório parar no centro do Ribeirão e entrar num dos inúmeros restaurantes de ostras, uma das atrações que ali levam turistas e catarinenses. Os nomes são criativos e não falta por onde escolher: “Umas e ostras”, “Ostras e outras coisas”, “Ostradamus”, e outros. Localizados à beira do mar, escolho sempre ir ao Ribeirão na hora do jantar para apreciar o pôr-do-sol. O espetáculo do sol a cair tanto no mar como sobre os morros, deixa-nos sem palavras tal o fascínio da paisagem. Nesse antigo povoado, cedo à magia da hora e do lugar, à frescura e variedade de ostras servidas no “Maria vai com as ostras”, bebo caipirinhas, e delicio-me com a abundância de marisco e de belezas naturais que o Ribeirão da Ilha nos proporciona.

 

Manuela Marujo
Imagens cedidas por Manuela Marujo

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