Viagens

A terra dos meus avós está na moda

O Alentejo está na moda. O viajante procura, na Costa do Sudoeste, a beleza dos quase 50 quilómetros de praias desertas, sejam elas de rochedos escarpados e acesso difícil, ou planas e abertas ao oceano. Busca igualmente a tranquilidade nalgum “monte” com alojamento rural nas planícies e oiteiros do interior seco e árido, ou a oferta das águas calmas no maior lago artificial da Europa, no rio Alqueva.

O conceituado guia de viagens “Lonely Planet” considerou o Alentejo este ano como um dos 10 destinos turísticos mundiais mais relevantes. O jornalista Eric Lipton, do New York Times, escreveu um artigo, na edição de 28 de agosto, dedicado ao Alentejo onde tudo são descobertas maravilhosas. Americanos, franceses, suíços e outros estrangeiros famosos abrem boutiques, renovam palacetes e constroem hotéis de luxo. Todavia, não são apenas os estrangeiros a admirar o Alentejo; os nacionais igualmente começaram a valorizar a autenticidade da paisagem com horizontes sem fim. Na primavera, contemplam-se os campos coloridos de papoilas vermelhas, no verão os trigais amarelos e, durante todo o ano, as oliveiras centenárias e os sobreiros, os castelos dos mouros alcandorados no cimo dos montes, dólmens e antas, testemunho da presença humana desde há muitas centenas de milhares de anos.

O Alentejo esteve abandonado e esquecido pelo poder central ao longo dos séculos mas, hoje em dia, os amantes de viagens buscam a natureza preservada e genuína. As voltas que o mundo dá!

Santa Vitória é uma pequena aldeia localizada no centro do Alentejo. Nasci lá, mas apenas associo este lugar aos meus quatro avós. Tive o privilégio de, durante os meus primeiros cinco anos de vida, todos lá morarmos.

A 15 quilómetros da cidade de Beja, esta aldeia pouco se distingue de outras: ruas longas e direitas, casas caiadas de branco, com barra azul ou ocre, porta de entrada e poial, raras janelas para a rua. A fábrica de moagem de trigo, o lagar de azeite e a Casa do Povo são, na minha lembrança, os edifícios que se destacavam na freguesia. Nem a igreja era especialmente bonita ou importante pois os alentejanos são pouco “santanários”.

A estrada nacional passa em Santa Vitória. Lembro-me que as casas que a ladeavam tinham sempre uma ou mais cadeiras à porta. Era ali que se sentavam os donos da casa e vizinhos, a observar os carros, camionetas e bicicletas que passavam, e que constituíam motivo de conversa e distração. A nossa casa ficava na movimentada Rua da Estrada.

A casa dos meus avós paternos era muito perto. Bastava atravessar a estrada a correr. Moravam na muito larga Rua das Eiras, numa casa sem janelas, com muitos quartos interiores. Ao descer dois lanços de escadas, logo tínhamos acesso ao enorme quintal onde a avó criava galos, galinhas, coelhos e um porquinho. Os meus avós maternos moravam um pouco mais afastados, perto da Casa do Povo, onde o meu pai era escriturário.

A maioria dos moradores de Santa Vitória eram trabalhadores do campo. Sendo os meus quatro avós analfabetos, tinham vindo à procura de trabalho nas grandes propriedades dos latifundiários, onde ficaram a mondar, ceifar e na apanha do grão e da azeitona. Uma das melhores lembranças que tenho é o “cante”. Os grupos de trabalhadores iam e vinham do campo a cantar. Antónia, a minha avó paterna, era conhecida por, na sua bonita voz, cantar ao desafio melhor do que ninguém.

Muitas décadas depois, a aldeia mudou bastante. A barragem do rio Roxo trouxe desenvolvimento para a freguesia e esta área produz agora bom vinho e a sua gastronomia atrai muitos visitantes.

Em 2013, por via da reorganização administrativa, Santa Vitória e Mombeja ficaram agregadas numa só freguesia.

 

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Imagens cedidas por Manuela Marujo

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