Temas de Capa

Pedro Varela e Cristóvam: Vai ficar tudo bem

Um músico e um realizador unem forças e criam um hino de esperança. Andrà tutto bene (em português, Vai ficar tudo bem) percorreu a Internet, comovendo quem está de quarentena em casa ou na linha da frente a combater o surto da covid-19.

Milénio Stadium: “Vai Ficar Tudo Bem”, uma canção e um vídeo que já são um grito de esperança…
Cristóvam: Começou por ser uma coisa minha, sem tanto essa intenção. Quando surgiu um primeiro esboço da canção e quando eu o partilhei com o Pedro é que passei de um momento mais de impulso, digamos assim, para um momento em que se faz essa análise do que é que pretendemos realmente transmitir com a canção e o que é que o Pedro pretende transmitir com o filme. Acho que o resultado final é um bocadinho isso: o intuito principal que nós tínhamos era mandar uma mensagem de esperança.

MS: E com isto tudo já deram meia volta ao mundo, sem sair de casa!
C: É um sentimento um bocadinho estranho… criámos aqui uma peça que tem andado a circular pelo mundo todo, temos feito entrevistas um bocadinho para todo o lado e há uma certa sensação de já termos feito muita coisa juntos em muito sítio e, na verdade, nunca saímos de casa, nem nunca estivemos sequer um com o outro. Mas é engraçado e acaba por ser confuso… estamos todos numa realidade que não é a habitual e estarmos a lidar com isto tudo, nessa versão alterada da realidade, faz com que tudo tenha uma percepção mais surreal do que o que teria.

MS: Estavam à espera que este vídeo se tornasse tão viral?
Pedro Varela: Quando eu, de alguma forma, me “convenci”, comecei a dizer ao Cristóvam que podíamos ir por aqui ou por ali. Eu sabia, por experiências anteriores, que ia ter um efeito qualquer forte. Eu não fazia ideia que as coisas fossem tão rápidas – meia hora depois de termos publicado o filme estávamos a receber telefonemas da televisão! É aí que tu percebes que alguma coisa se está a passar. Estamos a viver um momento particular e acho que tudo se encaixa muito bem. Os timings artísticos, sejam eles num momento como este ou não, a arte e a forma como nós lançamos um álbum ou um realizador um filme tem a ver com o momento: se houver um momento em que as comédias não estejam com grande hype, lançares uma comédia não te adianta de muito. Portanto, acho que houve uma leitura que foi feita: que há uma mensagem que era preciso passar! Uma mensagem que era, sobretudo, muito genuína e verdadeira e que veio do Cristóvam – ele pensou na música, eu a seguir pensei usar isto também como um espelho para todos os outros e a coisa foi ganhando essas dimensões e tornou-se quase num reflexo daquilo que todos estávamos a viver. E isso fez com que houvesse uma identificação gigante, que nem eu nem ele por estarmos dentro pudemos prever.

MS: A música já por si é super sentimental e com uma mensagem muito importante, mas mesmo assim necessita sempre de um rosto. Como conseguiram as imagens para este vídeo?
PV: Como eu disse, à medida que o Cristóvam ia acabando a letra e a música e dando toques aqui e ali, eu ia coletando coisas. Comecei a pedir ajuda a amigos, nomeadamente à Cloé, a menina portuguesa que está nas imagens e que vive em Paris. Disse-lhe que ia precisar dela para comunicar connosco através daqueles cartazes nos olhos, ela já estava a fazer imagens, assim como outras pessoas noutros lugares que nos estavam a enviar imagens que eu estava a pedir das ruas vazias, de tu em casa sem fazeres nada, de como estás a passar o teu tempo e tal. Até que lhe pedimos aquela última intervenção em que faz a ligação com o público. Tivemos de ser muito rápidos porque a música e o filme tinham que sair… e essa foi a nossa melhor decisão, por assim dizer.

MS: A nível pessoal, como é que vocês estão a viver este momento de pandemia e isolamento?
PV: Começo a sentir, agora, que parece que estamos a ir para um second round, não sei porquê. Parece que alguma coisa fez aqui um click, não sei explicar o que foi. Mas acho que já estamos todos a acusar algum cansaço, saturações… Eu sinto neste momento uma passagem, apesar de saber que ainda vamos passar um período igual praticamente ao que já passou. Eu diria que estamos no meio e é por isso que nós sentimos que estamos aqui a fazer uma transição, não sei explicar, mas há uma sensação de maior incerteza do que havia no início. Eu agora sinto que as incertezas começam a ficar maiores: ao início eu estava mais seguro de tudo e agora eu acho que se calhar estamos todos mais frágeis e começo a ter dúvidas em relação a muitas mais coisas, nomeadamente como é que vai tudo voltar ao normal… e não acho que vá ser assim tão fácil. Não é negativismo, acho que vai tudo voltar ao normal e vai tudo ficar bem, só que agora começamos todos a aprender um bocadinho mais sobre a complexidade do que se passa.
C: Para além da sua surrealidade, a minha quarentena tem tido toda esta componente nova que isto gerou. No meu caso, por exemplo, estou afastado da minha família com quem tenho uma ligação muito forte e que eu costumo ver todas as semanas com alguma frequência e que, neste momento, não o estou a fazer. Eu diria que é mais esta parte que me custa do que propriamente a questão de estar em casa – claro que estar em casa custa, mas no nosso meio acaba por ser muitas vezes uma realidade estarmos sozinhos já que é uma coisa que até precisamos. O sentimento de estranheza vem por tudo o resto e não por essa parte.

MS: Estão preocupados com as consequências que esta pandemia pode trazer para a cultura?
C: Sem dúvida. Acho que é uma asneira fazer qualquer tipo de medição sobre esse assunto, mas acho que vai ter um efeito devastador. Acho que o segredo para conseguir ultrapassar isto é toda a gente, em equipa, perceber que ninguém é melhor que ninguém e que todos estamos no mesmo barco a trabalhar para dar a volta. Mas que há muita coisa com danos irreversíveis há: teatros que não tiveram espectáculos durante meses, artistas que não representaram, artistas que não atuaram, concertos cancelados… e só estou a falar um bocadinho da área da música e teatro, mas a cultura abrange muitas outras coisas.
PV: Sim, as coisas vão estar fechadas muito tempo, não é? Neste momento nós temos salas por todo o país e por todo o mundo que estão fechadas e isso reflete-se na produção, reflete-se no dinheiro que vai haver no futuro, reflete-se no trabalho que toda a gente vai ter depois ao voltar. É quase uma bola de neve incalculável… As coisas precisam de mais de meio ano, talvez, para se tentarem normalizar e mesmo assim acho que vai ser difícil, o rombo é muito grande.
C: E mesmo pensando no rebut, isto é, pensando que isto acaba amanhã e que começam outra vez a haver concertos e espetáculos, é preciso perceber que as pessoas que são consumidoras destes espetáculos também elas estão numa situação financeira que não estavam antes e, portanto, é expectável que, apesar de toda a gente ter já uma sede enorme de consumir tudo aquilo que deixou de consumir por causa desta pandemia, as pessoas tenham que fazer contas para conseguir chegar a tudo e, inevitavelmente, vai haver menos pessoas a comprar bilhetes para ir ao cinema, para ir ver um concerto, para ir ao teatro… portanto, todas essas áreas vão sair lesadas mesmo depois da pandemia acabar.

Paulo Perdiz/MS

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