Temas de Capa

“Parece que se atrapalharam pelo caminho”

Esta semana trazemos-lhe a opinião de uma luso-canadiana que é, assumidamente, Liberal. Cristina Marques é feminista, empreendedora e voluntária. Apesar de reconhecer algum embaraço e de, nesta conversa, identificar alguns pontos que correram menos bem nestes quatro anos de governo, dá nota positiva a Trudeau.

Milénio Stadium: Que balanço é que faz destes quatro anos de governação de Justin Trudeau?
Cristina Marques: Penso que o Partido Liberal tem feito um bom trabalho, de 0 a 100 dou-lhes 65%. Eles tinham uma boa agenda, mas parece que se atrapalharam pelo caminho.
O Free Trade Agreement correu muito bem com os EUA e eles também conseguiram abrir o nosso mercado para a Europa. Por outro lado, com o oleoduto de Alberta perdemos uma grande oportunidade para exportar o nosso petróleo para o resto do mundo.

MS: Algumas pessoas votaram nele, em parte, por acreditarem que ele iria dar continuidade ao legado de Pierre Trudeau. Há a hipótese de ele ter defraudado esses eleitores?
CM: Pierre Trudeau era estimado pelos canadianos liberais e por uma certa franja de imigrantes. Mas não podemos comparar a realidade de hoje com o passado, o mundo mudou e temos problemas diferentes. Hoje a globalização, as alterações climáticas e as novas tecnologias colocam-nos novos desafios.
Eu decidi apoiar os Liberais porque, no meu ponto de vista, é lá que encontramos responsabilidade fiscal e consciência social, ou seja, podemos equilibrar a riqueza nacional e usar o dinheiro dos nossos impostos para apoiar os mais vulneráveis e resolver problemas económicos e ambientais.

MS: Ele é assumidamente feminista. Nas últimas eleições foram eleitas 88 mulheres, mais 12 do que em 2011. Acha que o país precisa de mais mulheres na esfera política?
CM: Eu sou formada em feminismo e sou assumidamente feminista, por isso defendo que há sempre lugar para mais mulheres na política e noutras áreas. Temos muitas mulheres que têm as capacidades e o know-how para serem eleitas para o Parlamento epara os diferentes ministérios, precisamos apenas de reunir as condições certas para que elas sejam eleitas. O Justin Trudeau melhorou muito esse ambiente e estamos a chegar lá aos poucos.
Mas ainda há muito a fazer, por exemplo, temos de parar de criticar mulheres jovens que querem estar na política e, ao mesmo tempo, serem mães. As condições têm que ser mais flexíveis para que as mulheres possam amamentar no trabalho, por exemplo. Com o próprio NDP ou com os Conservadores, sob uma liderança do Andrew Scheer, também seria fácil trabalhar neste tipo de medidas.

MS: Acha que a liberalização da canábis deveria ter acontecido de uma forma mais gradual? Foram feitos todos os estudos suficientes para pôr em prática a liberalização desta droga?
CM: Acho que a forma como ela está a ser vendida na província de Ontário é muito mais preocupante. Teria sido mais fácil legalizar as lojas que já trabalhavam com estes produtos em Toronto, por exemplo, do que fazer um leilão para eleger 25 novas lojas. O Senhor Ford tentou reinventar a roda e penso que não era necessário fazê-lo.
A liberalização não promove o consumo e assusta-me muito mais ver adultos a fumar um cigarro dentro de um carro fechado, sobretudo na presença de crianças.

MS: Como é que avalia a postura do governo no escândalo da construtora do Quebec, SNC-Lavalin?
CM: Este caso começou na Líbia há 11 anos e não sei se Lavalin será o nome mais certo. O que é realmente grave é a possibilidade do escritório de um primeiro-ministro interferir numa decisão do ministro da justiça e do procurador. Cada lado tem “a sua verdade” e, como se costuma dizer na gíria portuguesa, a verdade normalmente está algures no meio.
Acho que o caso da Huawei é mais grave do que este. Mas isto vai acabar por passar e não vai afetar os resultados eleitorais, creio que o ministro e o procurador da justiça vão ficar em duas pastas diferentes. Seria algo positivo que resultaria desta tempestade.

MS: Qual é a sua opinião geral sobre o estado do país e o que é que deve mudar no futuro?
CM: Se formos à rua perguntar aos canadianos, creio que a maioria vai queixar-se da saúde, da educação e dos impostos. Estes assuntos são muito complexos e difíceis de resolver, seja para os Liberais ou qualquer outro dos quatro partidos.
Acho que seria bom se o governo federal transferisse mais verbas para apoiar Ontário com o problema dos refugiados, sobretudo em Toronto. As leis da imigração também têm que ser revistas porque a nossa população está a envelhecer e estamos a recusar a entrada de muitas pessoas que querem trabalhar, de portugueses, por exemplo, só porque não dominam as línguas oficiais do país. Todos nós sabemos que eles fazem cá muita falta para preencher áreas que neste momento não estão a ser ocupadas.

Joana Leal

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