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O valor do dinheiro na política

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Afinal, quem é que pode concorrer para Presidente dos Estados Unidos da América?

Segundo a Constituição, o candidato terá de ser um cidadão nascido no país, ter pelo menos 35 anos de idade e ser residente nos Estados Unidos há pelo menos 14 anos. No entanto, a realidade é outra, e a Presidência não está ao alcance de todos. Para conseguir competir na vida política são necessários valores monetários que não poderiam ser atingidos pela maioria da população.

O custo das campanhas

O primeiro problema coloca-se logo pela duração das campanhas eleitorais. Nos EUA, desde o primeiro debate a 26 de junho de 2019 até ao dia de eleição a 3 de novembro de 2020, passam 496 dias de campanha. Enquanto que no Canadá, por exemplo, o Canadian Election Act especifica que o tempo mínimo de campanha são 37 dias com um máximo de 51 dias.

Uma Convenção do Partido tem um custo médio de 120 milhões de dólares, só o famoso ballon drop representa uma despesa de 150,000 dólares, e depois são ainda contabilizados todos os gastos em viagens, staff e a parte mais dispendiosa, a publicidade. As últimas eleições presidenciais, em 2016, tiveram um custo de 2.3 biliões de dólares.

Alguns países, principalmente na Europa, limitam a quantidade de dinheiro que pode ser gasto durante o período de campanha, de forma a tornar o processo político mais justo e transparente. O mesmo já se tentou implementar nos EUA, mas sem sucesso. O escândalo do Watergate deu origem à Campaign Financing Reform Bill que impôs um limite às contribuições que se poderiam fazer em período de campanha. Contudo, com pouco sucesso, já que a Primeira Emenda da Constituição protege o financiamento das campanhas uma vez que recai sobre a ideia de que se trata de liberdade de expressão. E a liberdade de expressão não pode ser limitada ou contida.

Até que ponto o dinheiro fala mais alto?

Outra questão a ter em conta é a diferença entre Hard Money – contribuições dadas diretamente a um candidato – que têm de facto um limite -, e o Soft Money – dinheiro gasto independente das campanhas, por exemplo, publicidade na televisão e que são considerados liberdade de expressão –, que não têm um limite imposto.

Nas eleições de 2016, vimos a questão polémica do Citizens United, uma organização sem fins lucrativos, que promoveu o filme “Hillary The Movie” que apresentava duras críticas à candidata, e isto em plena época de eleições para as presidenciais. Enquanto uns consideravam que este era um anúncio político cujas empresas não têm autorização para fazer, outros apresentaram-no como um simples documentário e, por isso, protegido pela Primeira Emenda (liberdade de expressão). Por fim, o Supremo Tribunal decidiu que as empresas e sindicatos, assim como qualquer pessoa com meios monetários para tal, tem o direito constitucional de gastar quantias ilimitadas de dinheiro para apoiar ou se opor a um candidato, desde que o faça de forma independente dos partidos. E assim prevalece um dos maiores problemas dos EUA, a falta de transparência, os jogos políticos e a manipulação do eleitorado.

Não há política sem dinheiro

Para um candidato conseguir participar na corrida política é incentivado, pelo próprio partido como um dos requisitos, a angariar um determinado montante monetário. Sem atingir essa meta, dificilmente terá qualquer hipótese. Ora, se as eleições são feitas com base nos patrocínios do 1% da população, põe-se a questão se os próprios políticos não estão mais responsivos àqueles que contribuíram monetariamente para a sua campanha, e do qual dependem, do que aos interesses da população geral.

Os membros do Congresso, por exemplo, passam muito do seu tempo em eventos para angariar dinheiro e a sua capacidade e utilidade para o partido é medida pela quantidade que conseguem adquirir.  Por isso, muitas vezes, quem participa na corrida política são pessoas que elas próprias já têm muito dinheiro ou que têm acesso a um conjunto de pessoas influentes que podem contribuir monetariamente. O Senado é constituído por 100 elementos, dos quais 65 são milionários. E a Câmara de Representantes, com um total de 435 elementos, conta com 214 milionários.

No Congresso, o problema atinge ainda outro patamar: são forjados estudos, pagam-se a académicos para que num determinado assunto seja defendida uma decisão que pode não corresponder à verdade, mas que cumpre o objetivo daquele partido e dos que estão por trás dele, o que inclui as pessoas ricas que doaram o seu dinheiro em época de campanha. Isto tem sido bastante evidente quando o assunto são questões ambientais, em que se vai contra factos para cumprir a agenda das indústrias petrolíferas. Assim, através do investimento na política, mais especificamente em determinado partido e em determinado candidato, as grandes empresas e empresários conseguem influenciar e manipular o Congresso.

Então, pode-se comprar uma eleição?

Na verdade não, mas todo o dinheiro acarreta um custo.

Se olharmos para as eleições de 2016, Hillary Clinton angariou 1.4 biliões de dólares e Donald Trump 957 milhões de dólares. O facto de um ter mais dinheiro que o outro não foi um fator decisivo para o resultado final, mas certamente que sem dinheiro não conseguiam sequer concorrer.

Os gastos durante a campanha, nomeadamente em publicidade, são vistos como uma forma de amplificar o discurso. Ou seja, para entrar na competição é de facto necessário conquistar um determinado montante elevado, no entanto depois de um certo patamar já não faz assim tanta diferença para o resultado final. Isto, para as eleições presidenciais, onde normalmente os candidatos já são conhecidos do público e recebem frequentemente atenção a nível nacional, inclusive com a transmissão de debates. Além disso, os eleitores têm tendência a votar de forma consistente ao longo dos anos. Todavia, para as eleições no Congresso a história é diferente.

Mesmo que as eleições não possam ser compradas, a verdade é que se um milionário apoiar a campanha de um determinado candidato, e esse candidato vencer, esse dinheiro foi uma forma de investimento. A nível presidencial podem inclusive conseguir uma posição no Governo.

O desafio para o eleitor comum

A forma como o sistema político americano funciona cria grandes desafios para o eleitor comum, que precisa de analisar de forma imparcial cada candidato, já que é um país que possibilita campanhas negativas com o intuito de denegrir a oposição. E para perceber certas medidas que aquele candidato adota ou poderá a vir a adotar, precisa de entender (o que muitas vezes não é claro) quem são as pessoas e empresas que o apoiaram, pois certamente que esses se irão certificar que as políticas seguidas os beneficiam. Só influencia a política quem tem um certo nível de riqueza e essa influência política é utilizada para lhes criar mais riqueza.

Inês Carpinteiro/MS

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