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Jovens angustiados com regresso à escola

Jovens  angustiados  com regresso  à escola-canada-mileniostadium
Photo: DR

A pandemia COVID-19 alterou dramaticamente o modo de vida das famílias, pais e filhos canadianos. Devido ao distanciamento físico e ao aumento do desemprego, os pais alteraram as suas rotinas habituais e muitas crianças e famílias ficaram isoladas em casa durante meses. Para além dos pais, as crianças, em particular, podem não ter visto quaisquer amigos ou familiares enquanto estiveram isolados durante o bloqueio. No entanto, o impacto da pandemia nas famílias ainda não foi suficientemente analisado. Em junho a Statistics Canada fez um relatório para perceber como pais e filhos lidaram com a COVID-19, ou melhor dizendo, com a primeira vaga da pandemia.

As entrevistas que a Statistics Canada fez decorreram entre 9 e 22 de junho e a grande maioria eram mulheres que nasceram no Canadá e que tinham ensino universitário. O estudo não representa toda a população canadiana, mas ainda assim permite-nos retirar algumas conclusões. Os pais revelaram estar mais preocupados com o facto de as crianças não socializarem com os amigos (74%) e terem passado muito tempo em frente a um ecrã (64%). A solidão ou isolamento (54%), a saúde mental (46%) e o sucesso escolar (40%) surgem como as maiores preocupações depois da socialização e do tempo em que passam em frente a um ecrã. Os pais de crianças entre os quatro e os 11 anos (80%) e no ensino pré-escolar (70%) são os que estão mais preocupados com o equilíbrio entre a escola e o trabalho. Questionados sobre as atividades que os filhos fizeram durante a pandemia, os pais dizem que a maioria do tempo foi passado à frente de um ecrã (89%), seguindo-se leitura de livros e histórias (62%), atividades físicas (61%), jogos (23%), trabalhos manuais (21%) e outras atividades (18%). Segundo os pais, esta lista de atividades era diária ou quase diária.

Com o regresso às aulas nem todos voltaram a marcar presença física numa sala de aula e o receio dos pais fez com que na província de Ontário optassem maioritariamente pelo ensino à distância.  Quem regressou às aulas físicas foi confrontado com um novo modelo de escola com distância física entre os colegas e os professores, medição de temperatura, higienização das mãos frequente, etc.

A Kids Help Phone lida especificamente com pedidos de ajuda de crianças e jovens e a assistência vai desde aconselhamento sobre saúde emocional, bullying, abuso, escola, trabalho, relações sexuais, amigos, família, identidade e até saúde física. O serviço está disponível 24 horas por dia e sete dias por semana e as crianças podem entrar em contacto com a Kids Help Phone através de uma linha telefónica ou um simples envio de uma mensagem. Todos os dias a organização recebe 446 chamadas telefónicas e 423 mensagens via telemóvel de jovens de todas as províncias canadianas. Em Ontário uma chamada demora em média 40 minutos e a maioria dos jovens que recorre a esta linha de apoio tem entre 18 e 24 anos (38%). Logo depois surgem os jovens entre os 14 e os 17 anos (28%); os jovens com mais de 25 anos (22%) e os jovens entre os cinco e os 13 anos (13%). Em matéria de assuntos que preocupam os jovens a saúde mental e emocional surge no topo das preocupações (44%), seguida por problemas nos relacionamentos (16%), problemas familiares (8%), escola (6%) e suicídio (5%). A nível de mensagens de texto enviadas por telemóvel também há motivos para preocupação: depois dos relacionamentos (41%), a ansiedade e o stress (40%); depressão (31%); suicídio (20%) e isolamento (21%) lideram o ranking de preocupações dos jovens em Ontário.

Na análise por províncias e territórios, a saúde mental e os relacionamentos lideram as preocupações dos jovens, mas nos territórios do Noroeste o suicídio lidera o ranking e em Nunavut 50% dos jovens procura esta linha de apoio para falar sobre problemas de saúde mental e os outros 50% relatam abusos e violência sexual.

Os piores dias da semana para os jovens são o sábado (15%), o domingo (16%) e a segunda-feira (17%) entre a meia-noite e as 4 horas e entre as 4 e as 8 horas. No mês passado 59% dos jovens disse ter confessado algo à Kids Help Phone que nunca dito a ninguém e 84% admitiu sentir-se melhor depois de ter trocado mensagens por telemóvel.

Quase toda a gente tem dias maus de vez em quando e muitas pessoas sentem-se exatamente da mesma forma que estes jovens se sentem. A Kids Help Phone dá algumas dicas para quem esteja a lidar com tristeza ou depressão: Aprenda a desligar– faça planos com os amigos ou com a família, ria e passe tempo com aqueles que ama; Aprenda a desabafar– chore, grite, não há nenhum problema em expressar-se da forma em que se está a sentir; Aprenda a respirar– foque-se na respiração, respire fundo relaxe o corpo e a mente e concentre-se em sentir-se melhor; Aprenda a focar-se em si – o que é que o faz feliz? Reserve algum tempo para fazer algo sozinho, como por exemplo ouvir a sua música preferida ou ver a sua série de TV preferida; Ajude a sua comunidade– se está a ter um dia mau ajude alguém a ter um dia melhor e isso vai fazer com que se sinta melhor. Faça algo por um amigo ou torne-se voluntário numa das instituições da sua comunidade local; Faça exercício físico– caminhadas, aulas de dança ou qualquer outra atividade física que lhe dê prazer. Isto pode ajudar a melhorar o seu estado de espírito e fazer com que a sua saúde mental e física melhore. Faça trabalhos manuais- desenhe, pinte ou escreva sobre o que está a sentir e transforme o seu dia em algo criativo. Fale sobre o assunto– às vezes para que se sinta melhor basta que fale sobre o seu problema com alguém, pode ser um amigo, um professor ou um familiar.

Leia também: Schools in Burlington and Haldimand County have COVID-19 cases after 1st week

Segundo a Organização Mundial da Saúde, depois dos acidentes de trânsito, o suicídio é a segunda principal causa de morte entre os 15 e os 29 anos em todo o mundo. Em 2016 a taxa global de suicídio foi de 10,5 por cada 100 mil pessoas. As taxas variam muito entre os países e em alguns existem cinco mortes por cada 100 mil habitantes e noutros 30 mortes por cada 100 mil pessoas. Enquanto 79% dos suicídios no mundo ocorreram em países com baixos rendimentos, os países mais desenvolvidos apresentaram a maior taxa, 11,5 para cada 100 mil. Segundo números oficiais, no Canadá todos os dias morrem quase 11 pessoas vítimas de suicídio e os homens e os rapazes são um dos grupos de risco. Abaixo publicamos uma entrevista feita à Kids Help Phone, uma associação que recebe pedidos de ajuda de jovens que residem em todas as províncias e territórios canadianos.

Milénio Stadium: A Kids Help Phone está disponível 24 horas por dia e sete dias por semana. A procura aumentou com a pandemia?

Kids Help Phone: Em comparação com o ano passado, a procura pelos nossos serviços disparou 112%. Desde o início da pandemia em março que temos registado um aumento em três tipos de conversas entre os nossos assistentes e os jovens: isolamento, ansiedade e stress e uso de substâncias.

MS: O regresso às aulas foi muito diferente este ano. Como é que as crianças se sentem com todas estas mudanças?

KHP: Milhões de jovens em todo o país voltaram à escola, seja de forma virtual ou pessoal, e os dados do Kids Help Phone revelaram que um em cada três jovens que se comunicam via mensagem de texto se sente angustiado com a ideia de voltar para a escola. O regresso às aulas é a terceira maior preocupação dos jovens depois da solidão e da saúde mental em geral.

MS: Agora a maioria das aulas é online. O cyberbullying é uma preocupação?

KHP: Navegar nas aulas online pode ser diferente e pode trazer preocupações sobre o cyberbullying, já que os espaços seguros dos jovens, como as suas casas, estão abertos à visualização de outras pessoas. Recomendamos aos jovens que protejam as suas palavras-passe; que não divulguem informações pessoais como número do cartão de crédito, morada, número de telefone, nome da escola, o seu nome completo. Os jovens devem ainda recusar reencaminhar mensagens de telemóvel com conteúdo cruel e recusar participar em concursos que fazem rankings com base na aparência das pessoas. Não aceitem pedidos de amizade de estranhos e se não reconhecerem o autor de uma mensagem não a abram.

MS: De onde é que são os jovens que contatam a Kids Help Phone?

KHP: Os jovens que entram em contato com o Kids Help Phone são de todas as províncias e territórios do Canadá. Recentemente, lançámos uma nova plataforma, Kids Help Phone Insights, que mostra dados atualizados a nível nacional e provincial. Esta nova ferramenta também inclui análises e tendências sobre as questões para as quais os jovens estão a procurar respostas.

MS: Em Ontário 44% dos jovens liga para esta linha de apoio porque precisa de ajuda ao nível da saúde mental e emocional. Logo a seguir a maior preocupação dos jovens está relacionada com ansiedade e stress. O que é que isto nos diz sobre o futuro da sociedade?

KHP: Durante estes tempos sem precedentes, é importante lembrar que esta pandemia é nova para todos nós. Por mais que os adultos possam estar a sentir ansiedade em relação a fatores stressantes de ordem financeira e profissional, entre outros, os jovens foram desligados das suas rotinas e passaram longos períodos longe dos seus amigos e colegas. Sabemos que os principais fatores que contribuem para o sofrimento incluem sentimentos de solidão e isolamento, lutas com doenças mentais e preocupações com o encerramento da escola e do trabalho.

Joana Leal/MS

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