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Diário de um Pai Solteiro: A realidade dos pais nos dias de hoje, preto no branco.

Todos nós temos um pouco de “panda” – seja pelo instinto protetor sobre aqueles que nos são mais queridos ou pela preguiça que tantas vezes se apodera de nós. Quem nunca se imaginou, tal como este animal asiático tão fofo, a passar entre 10 a 16 horas do nosso dia a comer e, no restante, a dormir? Não sabemos se foi algum destes dois fatores que levou este pai solteiro, autor da página de Facebook “Diário de um Pai Solteiro” a intitular-se como “Pai Panda” e à sua filha de “Panda” ou “Pandinha” – o que temos a certeza é que esta é uma história que, com certeza, irá gostar de conhecer e, provavelmente, acompanhar através das publicações que vão surgindo regularmente na sua página.

Milénio Stadium: Está separado há cerca de quatro anos e tem uma “pequena pandinha” de cinco anos. Como tem sido essa experiência?
Diário de um Pai Solteiro: Não sei, passa muito rápido. Por vezes choramos os dois, eu e a Pandinha, pelo tempo passar rápido. Uma das coisas que nos faz chorar é ela ser demasiado grande agora para andar num atrelado preso à bicicleta. Tem ido numa cadeira na bicicleta, mas não é a mesma coisa. Tem saudades de ir no atrelado, num casulo protegido, com o peluche ao colo. E eu também tenho saudades. É assim a paternidade. E cada par de sapatos dela que vai para lixo, desfeito e pequeno demais ao fim de dois meses, é um bocado da paternidade que passou. A este ritmo vai calçar o 43 como eu antes de me sair de casa para a universidade.

MS: Os “filhos de pais separados” são cada vez mais uma realidade? Como se pode definir todo o processo de separação e o cuidado que se tem, ou deve ter, em relação às crianças?
DPS: No nosso caso a Panda era muito pequena por isso não deu por isso, é quase uma realidade em que cresceu. Não sei bem como faria com ela mais crescida, mas acho que não faríamos disso um drama. Acho que é preferível uma criança crescer em dois lares com harmonia do que num com discórdia. Claro que ainda acho que o preferível é a família estável clássica. Mas também defendo a partilha 50/50. Uma criança precisa do pai e da mãe. Também compete aos pais chegarem-se à frente e demonstrar. Há pais que querem 50/50 e depois quem toma conta dos filhos são os avós deles ou então são terrivelmente irresponsáveis.

MS: Mantém uma boa relação com a sua ex-mulher. Será também essa a base para o sucesso da educação e desenvolvimento dos filhos?
DPS: Não sei como é que depreendeu isso da minha página, mas fico feliz, porque a minha advogada tem estado preocupada e pediu-me para ler este depoimento: É importante que os pais realmente se separem. Quando têm ressentimentos e conflitos após uma separação isso significa que não se separaram. Odiar alguém é um sentimento tão forte como amar. Têm de se separar para reconstruir o par de pais separados dos filhos numa base algo neutra. É mais fácil falar do que fazer. Tive sorte, a mãe da Panda, que eu na página chamo carinhosamente de Pata Hidrofóbica mas aqui não posso porque a advogada me pediu para não o fazer, tem uma ética irrepreensível. Nestas coisas pode ser uma bola de neve. Se um ataca o outro ataca a dobrar e gera-se uma bola de neve com tribunais e situações terríveis.
(Estou aqui tão zen, pena ser anónimo, a minha ex não faz puto de ideia ainda que estou a dizer estas coisas, mas espero que sirvam em minha defesa quando tiver de lhe dizer).

MS: O que é isso de ser um “Pai Panda”? O que é para si a paternidade?
DPS: Acho que se vai descobrindo porque todos os dias muda, pelo menos com o primeiro filho. O facto de ser pai solteiro faz com que tenha uma relação um para um. Numa família normal é pelo menos um triângulo. Eu e a Panda somos companheiros porque preciso de a levar comigo para tudo o que queira ou precise de fazer. O fundamental é sermos a base de proteção e segurança que diz que ela é capaz. É uma menina. Irrita-me especialmente nas mulheres a dúvida. Pensam imenso e são mais pessimistas, mais cautelosas.
Notei a certa altura que a Panda tinha medo do abandono, pela mudança de casa para casa. Por exemplo, apesar de adorar o reboque, achava que ele se podia soltar e eu esquecer-me dela na estrada. Era literalmente impossível do ponto de vista técnico mas também mesmo que se soltasse eu ia dar pela bicicleta subitamente 40 kgs mais leve… Mas ela chorava: “Tu vais-te esquecer de mim!” E era eu a jurar “NUNCA TE VOU ABANDONAR!” na rua e os dois aos abraços e pessoas a ouvir aquilo e a olhar de lado. Outra parte da coisa para mim é tentar dar algo que ela não tem, que precisa e mãe não lhe dá. A mãe também lhe dá coisas que eu não consigo dar e ela precisa, como vitaminas ou o sentido do certo e do errado e essas coisas. Por exemplo, a mãe ensina-lhe que não se deve mentir. Nunca me passaria ensinar isso a uma criança que quero que tenha sucesso profissional.

MS: Porque é que sentiu necessidade de avançar com o projeto “Diário de Um Pai Solteiro”?
DPS: Na altura, como conheci a mãe da Panda pela internet, pensei que poderia conhecer outra mulher assim top pela página. Não sabia que a maior parte do meu target feminino iam ser mães casadas e grávidas felizes. Errei o target nisso. Devia ter feito uma página sobre gatos, variedades de gelado em promoção, séries de Netflix e cinema italiano e sueco, num tom mais depressivo, mais niilista… Mas depois a página ganhou vida própria e gosto dela assim.

MS: Será também esta uma forma de dar voz a outros pais que se sentem, de alguma forma, mal-entendidos ou pouco valorizados?
DPS: Não sei se serão tantos assim. Mas de facto legal e culturalmente parte-se da ideia que as mulheres é que têm de tomar conta da criança. Nos contos de crianças que lhe leio mudo frequentemente o género, porque no original é sempre a mãe que dá de comer, que aconchega, que deita na cama, que lê a história, que se preocupa… O pai é sempre um gato de óculos que está a fumar cachimbo absorto num jornal ou na garagem a mexer no motor do carro, distraído. Mas penso que as mães solteiras são menos valorizadas. Eu lembro-me quando andava com a Panda no marsúpio com os sacos de compras do supermercado, já depois da separação, com aquele ar exausto de quem tem de fazer uma casa funcionar com um bebé adorável ao colo… Sim, sentia estrogénio no ar a vir das mulheres. Sentia-me naqueles anúncios de perfumes masculinos em que as mulheres desmaiam. Senti o que é ser o Brad Pitt. Talvez esteja a exagerar. Bom, uma mulher com um bebé, sozinha, é algo invisível, o marido deve estar no trabalho ou algo assim e ela deve estar com péssimo feitio.

MS: Apesar de ser uma página de um “pai solteiro” as interações e comentários surgem principalmente do público feminino. É bom ter este feedback e este interesse por parte das mães?
DPS: Sim, isso é bom, estão a aprender a forma correta de educar uma criança, mas vão melhorando. Ainda hoje vi uma avó a cometer um erro de palmatória que um pai nunca comete. Uma menina de dois anos, provavelmente a neta, a correr disparada num parque. Como era previsível espetou-se no chão ao fim de 10 metros. O que fez a avó? Deitou mãos à cabeça e foi a correr para a criança. Naturalmente esta começou a chorar depois da avó chegar toda consternada ao pé dela. Um pai homem normal encolheria os ombros e depois faria sinal de impaciência com as mãos tipo “atão!? O que é que foi isso pá?!” E ia com calma ver o que se passava. Uma vez vi uma mãe a fazer isto por acaso. Deve ter aprendido com a minha página. São ansiosas, as mães. É divertido, mas são ansiosas.

MS: Este “diário” possui agora também uma página semanal no Vida Extra, do jornal Expresso. Mais uma validação do sucesso deste projeto?
DPS: Não penso muito nisso para não sentir pressão. Sempre quis escrever num grande jornal, é um passo natural na minha carreira, mas tenho de agradecer a toda gente por esta oportunidade e vou tentar dar o meu melhor. Escrevo o que o mister quiser, se for preciso escrever sobre dietas também escrevo.

MS: Que temas aborda tanto na sua página de Facebook como neste último projeto?
DPS: Nas crónicas do Expresso não posso construir uma personagem e os textos são mais descolados de um diário. Basicamente são sempre dois temas fundamentais. Um são as relações homem – mulher (dating, casamentos, paixões, separações etc,) e ou outro são considerações gerais sobre paternidade.

MS: A parentalidade é, regra geral, um assunto comumente associado às mulheres… será que isso tem vindo a mudar? Ou cada vez mais o “pai” ou o “marido” é considerado uma peça quase “dispensável”?
DPS: Acho que tem mudado muito no espaço de uma geração. A geração do meu pai é a típica Lobo Antunes digamos assim, aquele homem que não consegue dizer as coisas diretamente, são uns traumatizados, cheios de feridas, presos entre pais austeros e filhos hiper sensíveis por causa dos filmes e séries americanas. Mas há dois eixos, um são pais que por alguma razão estão dispostos a perder a oportunidade de estar com os filhos nestas idades fabulosas, talvez pensem que valha a pena gastar o tempo em coisas absolutamente pequenas como a carreira. Outros são imaturos e um dia mais tarde vão-se arrepender amargamente – isto claro nos casos em que eles podem e não querem, o que nem sempre é o caso em separações que envolvem, por exemplo, cidades diferentes. O outro são mulheres que preferem ter o monopólio da criança desde o nascimento, ou por pressão cultural ou porque não querem deixar o pai crescer e fazer as coisas mais à maneira dele. E digo já, uma mãe que opta conscientemente por ficar com um filho a tempo inteiro, se não tiver apoio da família, vai ter a vida pessoal e profissional seriamente limitada. Muitas mulheres também não percebem que é positivo fazerem crescer o ex e que ele seja alguém em quem podem contar.

MS: Algum conselho em especial que gostaria de dar aqueles que, assim como você, são pais solteiros?
DPS: Não me atrevo, têm o meu respeito. Só posso partilhar experiências. Se calhar, se tiverem uma menina, daria o conselho de tentarem fisgar outra namorada quando a vosso Panda tiver menos de 2-3 anos. Quando a vossa Panda chega aos 5-6 começa a ser mais intimidante. Quando for adolescente, esqueçam, têm de esperar até ela sair de casa e ir à sua vida, a não ser que a pretendente for completamente kamikaze ou experiente a lidar com animais selvagens.

Inês Barbosa

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