Temas de Capa

De mãe para mãe

Tenho a folha em branco e a angústia de não saber por onde começar… como escrever sobre a Mãe sem recorrer a lugares-comuns? Sem sentir que estou a plagiar outros – poetas; pensadores; psicólogos? Como explicar sentimentos inexplicáveis? Como? Logo eu que até nem sou de mostrar o que sinto. 

De mãe para mãe-portugal-mileniostadium
Crédito: DR.

Vá-se lá saber porquê, veio-me agora à memória o sótão de casa da Florinha (amiga de infância da minha mãe), onde com as filhas, uma mais velha que eu e outra mais nova, brincava com as bonecas. Lembro-me das comidas que fazíamos e acreditávamos serem um verdadeiro pitéu e que dávamos às nossas “filhas”, que ficavam lambuzadas com a argamassa de farinha e água que lhe tentávamos enfiar pela boca (semiaberta) abaixo. “Agora vamos ter que lhes dar banho”. Mais uma aventura. Venha a banheira, que na verdade era uma bacia de plástico e onde afundávamos, literalmente, as pobres coitadas. E os vestidos que eram feitos pela avó de alguém, os panos presos à cintura com um alfinete de dama que serviam de fraldas… os raspanetes quando alguma se portava mal, que podia levar a castigos ou até, em casos extremos, a uma palmada no fundo das costas. Tardes inteiras nesta reprodução quase exata daquilo que era o nosso dia a dia ou a memória de tempos não muito recuados. 

Não sei se vem desse tempo a ideia que sempre tive como certa para a minha vida – um dia gostaria de ser mãe. Fui. Tinha 27 anos e entrei em pânico quando me vi com um bebé completamente dependente de mim. E agora? Onde está o livro de instruções? E se não sou capaz? Nunca senti tanta falta da minha mãe como nessa altura. A mãe mais competente e experiente do mundo. A mais carinhosa, a mais protetora, a mais implacável quando se tratava de cumprir com obrigações… a mais bonita. “Mãe ajuda-me, por favor!” Era um grito surdo, interior. Hoje sei que tudo o que, entretanto, fui descobrindo que já sabia, vinha dos ensinamentos que ela me tinha dado, sem dar. Pelo exemplo, pelas ações, pelas certezas e hesitações. Tudo o que descobri em mim como mãe, aprendi, ao longo dos anos, enquanto filha. E percebi que os ciclos da vida se vão fechando, numa lógica que assenta na educação que se recebe, na informação que se acumula, enquanto somos inundados de amor. De mãe para mãe, de filha para filha…

E a minha mãe é mesmo a melhor do mundo! Sim, eu sei que tinha prometido a mim mesma não recorrer a frases feitas e até demasiado vulgares, mas não sei como contornar esta evidência na perspetiva da filha mais babada que existe ao cimo da Terra. Pronto… mais um lugar-comum. Eu não vos dizia que não estava a ver como poderia fugir disto?

Madalena Balça/MS

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