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Centro Cultural Português de Mississauga precisa de ajuda para não fechar

Centro Cultural Português de Mississauga-canada-mileniostadium
Entrevista com a direção do clube no programa Here’s the thing na Camões TV, conduzido por Manuel DaCosta.

 

Durante décadas, a nossa cultura tem sido celebrada e honrada através dos clubes e associações portuguesas que incutiram como sua missão promover a cultura portuguesa. Hoje em dia, com os desafios causados pela pandemia são muitos os clubes que se encontram com dificuldades em manter a porta aberta. E numa comunidade que vê a erosão lenta da sua cultura… O que podemos esperar do futuro e o que se espera de nós?

Esta semana, Manuel DaCosta, para o programa Here’s The Thing na Camões TV, entrevistou dois membros da Direção do Portuguese Cultural Centre of Mississauga. Tony de Sousa exerce o cargo de 37º presidente deste clube, um cargo que vem a desempenhar já há sete anos e ao qual acrescem 24 anos como voluntário. À conversa, juntou-se também Jorge Mouselo, há três anos no cargo de vice-presidente e com vários anos dedicados a fazer o clube crescer. 

Manuel DaCosta: Qual o motivo que vos leva a dedicar parte da vossa vida a esta associação?

Tony de Sousa: Eu sou o sócio número 125. Comecei na Dundas e quando fui para Mississauga mudámo-nos para perto de alguém que já tinha sido presidente e estava muito envolvido no clube. Dois dias depois de nos instalarmos, ele bateu-nos à porta a pedir a participação da Luísa que já tinha sido Miss Toronto. E foi assim que começámos a ser sócios do clube e a ir. Na altura éramos jovens por isso a nossa presença não era tão regular. Mais tarde, foi presidente o Gilberto Moniz, de quem eu era amigo, e convidou-nos para nos envolvermos mais e depois aquilo entrou-me no sangue. Ganhei amor pelo clube, por ser uma parte da nossa comunidade. Tenho feito 24 anos seguidos sem parar e espero continuar.

MDC: Qual é o pagamento que recebes em troca de todo o trabalho que desenvolves?

AS: Por vezes, é um pontapé (risos). Tem coisas boas, existem pessoas que reconhecem o nosso trabalho, claro que de vez em quando aparecem delas menos boas, mas tudo passa. O que importa é fazermos o que nós gostamos e fazer aquilo de coração.

MDC: O PCCM identifica-se mais com Mississauga, mesmo que seja visitado por pessoas de outras áreas de Toronto. Achas que isso tem ajudado o clube ou tem-no afastado da restante comunidade do GTA?

Jorge Mouselo: Penso que somos mais conhecidos como o Clube de Mississauga, mas penso que não é negativo. Tentamos fazer algo diferente e fazer parte de tudo o que diz respeito à comunidade. Quando planeamos um evento, a primeira pergunta que fazemos é “será que a comunidade vai gostar?”; “Será que os nossos sócios vão querer participar?” Tudo o que fazemos, envolve a comunidade em geral, sócios ou não sócios, amigos, patrocinadores, etc. Isso é o que nos mantém abertos e capazes de fazer tudo o que temos desenvolvido até hoje para receber a comunidade.

MDC: Em 2001, quando se mudaram para Mississauga, foi um empreendimento enorme, com instalações próprias e talvez tenham criado um modelo que deve ser visto pelas outras associações como um exemplo a seguir. O planeamento e gestão do clube foi sempre baseado no voluntariado e na participação do clube. Acham que este é um plano sólido para continuar a ser seguido no futuro?

TdS: Quando começámos a nossa base eram os sócios e os voluntários. No entanto, o voluntariado está-se a acabar. Temos tido uma grande sorte, porque temos voluntários e diretores que nos têm acompanhado desde o início. São poucos os que entram e permanecem. Contudo, com os eventos a serem cada vez maiores já não podemos depender apenas de voluntários e acabamos, por vezes, por precisar de 18 pessoas a serem pagas. E será essa a tendência no Clube.

MDC: Contudo, isso conduzirá a um aumento de custos…

TdS: Exato, e teremos de ajustar as nossas contas a essa realidade. Um clube como o nosso, com vários eventos, exige muita dedicação dos nossos voluntários, são momentos em que não estamos com as nossas famílias e nós até temos a sorte de as nossas esposas nos acompanharem. É preciso um equilíbrio e por isso, entre mim e o Jorge, por vezes em certos eventos a presença de um já dispensa a do outro, de forma a também passarmos tempo em família.

MDC: Como correu o vosso último evento?

JM: O torneio de golf foi ótimo. Para ser sincero, não esperava tanta gente, mas foram muitos os que se envolveram. E tive o privilégio de ver todos no evento, felizes por fazerem parte daquilo. Fizemos também um evento virtual e foi também um sucesso. É isso que nos faz trabalhar para o Clube.

Em relação aos voluntários, está-se a tornar cada vez mais difícil, mas temos de ser agradecidos e valorizar os voluntários que temos, porque estão sempre prontos a ajudar.

TdS: É engraçado, por vezes chegamos a uma altura em que, semana após semana, nos sentimos saturados. E agora eles dizem o quanto adorariam poder ir para o clube trabalhar. Agora dávamos tudo para ser saturados ao máximo.

MDC: Estamos a passar por um momento difícil, particularmente aqueles que têm negócios. E o Clube de Mississauga, mesmo sendo um clube forte e com vários sócios, imagino que também esteja a sofrer financeiramente, assim como as restantes associações. Recentemente, enviaram uma carta aos sócios para que, quem pudesse, contribuísse um pouco.

TdS: Temos tido uma resposta muito boa às cartas que enviámos. Ainda na sexta-feira, uma senhora que já tinha sido voluntária telefonou-me a dizer que ia deixar um cheque e quando o vi até parece que me veio as lágrimas aos olhos… uma pessoa reformada e dar um cheque de mil dólares, não é qualquer pessoa que faz isso. E temos tido várias pessoas a contribuir. Ainda no outro dia, uma senhora que nos ajuda lá no clube foi levar 300 dólares e disse “isto se calhar não vai parar por aqui, quando precisarem de mais digam”. E quando ouvimos respostas destas, ficamos mais otimistas.

JM: Antes dessa carta ser publicada, tivemos várias reuniões sobre este tema. E chegámos ao ponto de sentir que temos de perder a vergonha e pedir a quem gosta de vir aqui, a quem já se divertiu connosco. Essas mesmas pessoas estão ansiosas por regressar ao clube e não querem que isto acabe. Tudo o que podermos fazer, vamos fazer. Estamos a lutar por isto.

MDC: Aproveito também para vos agradecer, já que esta semana cozinharam para 25 pessoas no seguimento da nossa campanha de solidariedade. Mesmo em tempos complicados, o Clube de Mississauga mostra-se disponível para contribuir e isso é um sinal de que estão atentos ao que se passa na comunidade e que querem contribuir.

TdS: Só não participámos mais cedo porque tínhamos mandado desligar o gás e a água, mas agora já voltámos a estar funcionais e estamos prontos para ajudar.

JM: Quem não está envolvido no clube, ou na comunidade, por vezes, não se apercebe das necessidades. Tem sido uma luta manter as portas fechadas, mas abertas ao mesmo tempo.

TdS: Costuma-se dizer, durante vários anos abrimos a nossa casa a todos e agora está na altura de as pessoas abrirem a casa para nós. (risos) É uma brincadeira que costumo dizer.

MDC: Se estas condições permanecerem por mais cinco meses, como é que os clubes vão sobreviver? Tendo em conta que existem clubes que têm de pagar empréstimos, hipotecas e rendas altas. Como veem o futuro?

TdS: É complicado, embora tenhamos a nossa própria casa e uma hipoteca pequena, não é fácil como as pessoas pensam. Se o centro não está movimentado, o banco também não nos empresta dinheiro se necessário. Nós já nos mentalizámos que será assim até janeiro e vamos tentando fazer o que está ao nosso alcance. E todos em conjunto, vamos fazendo o que é possível.

No entanto, isto é muito duro para os clubes, especialmente se tiver de pagar uma renda alta. Onde irão buscar essa capacidade financeira?

MDC: Um ponto importante ao qual nos dedicámos esta semana no Milénio Stadium refere-se à sobrevivência da nossa cultura portuguesa… O que representa e quem vai puxar por ela? Precisamos de nos fazer ouvir e de ter alguém a fazer lobbying por nós.

TdS: Exato! O Governo dá tanto dinheiro para tantas coisas, e digo isto sem ofender ninguém, mas temos sempre as portas abertas para os nossos políticos e gostaria de os ver a defender os clubes e associações. É a nossa cultura que está em causa e todos os clubes precisam de ajuda, acho que deveriam olhar a isso. Perdemos um evento muito importante, a Carassauga, onde mostramos a nossa cultura ao mundo inteiro e já se fala que para o ano, em maio, talvez seja um evento virtual.

MDC: A cultura é uma parte essencial do nosso viver neste país. Continuamos a trabalhar para divulgar e ajudar o Governo a manter uma certa visão daquilo que Trudeau quis para este país. E ignoram-nos. Como podemos continuar calados?

JM: É de facto uma questão difícil de compreender e até difícil de lutar, porque não somos ouvidos por ninguém. Do nosso lado, tudo o que podemos fazer fazemos para manter a nossa língua e a nossa cultura viva. Nós, além dos eventos do clube, temos uma parte dedicada à educação. E hoje em dia sentimo-nos sozinhos.

TdS: Eu às vezes gostava de ver os políticos na linha da frente a lutar por nós. Até porque nós os apoiamos sempre que precisam.

JM: E por vezes temos de “morder a língua”, como se diz, porque talvez precisemos deles no futuro e hoje precisamos, e não temos ajuda.

MDC: Quem é que vai impulsionar a nossa cultura no Canadá? Vai continuar da mesma forma ou são necessárias mudanças?

JM: Eu penso que há uma necessidade de mudança, uma maior liderança, mais força através da união de clubes, associações, rádios, televisões, etc. Para isso, nós portugueses teríamos de ser mais unidos e lutar em conjunto pela nossa cultura e pela nossa língua que está a fugir.

TdS: Por vezes, preocupamo-nos demais em andar às turras uns com os outros.

MDC: Gostaria que deixassem uma mensagem para a comunidade. O que é que a comunidade pode fazer para ajudar os clubes e promover a nossa cultura?

TdS: Deixo a mesma mensagem que tenho vindo a rogar… Precisamos de muita ajuda, dentro das possibilidades de cada um claro, para não fecharmos as portas. Eu gostava de ver essa força, essa união. No nosso clube, quer esteja aberto ou fechado, vão-se embora 15,000 dólares por mês, e isto apenas nos gastos básicos mensais. Se tivermos 700 sócios e cada um der 100, são 70,000 dólares e faz toda a diferença. E deixo o apelo à comunidade, tanto aos sócios como não-sócios, que nos continuem a apoiar.

MDC: Deixo também o meu apelo à comunidade, para não se esquecerem que os nossos clubes e a nossa cultura precisam de nós.

Transcrição: Inês Carpinteiro

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