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Avós: O sabor a casa

Ainda sou da geração que cresceu com os avós quando os pais iam trabalhar. Eram eles que nos iam levar e buscar à escola. A geração que sofria com o “tens de comer mais”, o que me valeu uns quilos extra na infância porque toda a gente sabe que as torradas da casa da avó são melhores do que as da nossa casa. E em casa da avó sabe tudo bem, desde a sopa ao peixe, aos bolos que ajudávamos a avó a fazer e, o meu preferido, o pão quentinho com açúcar que a avó nos deixava amassar e que mostrávamos depois aos pais todos orgulhosos.

Na verdade, sabemos que eles com os nossos pais eram bem mais rígidos, talvez o passar dos anos os tenham amolecido. Hoje já têm mais paciência para as birras e não só cedem mais facilmente às nossas manhãs, como ainda nos ajudam, “deixa a menina” dizem eles sempre que os pais vêm com um ar mais autoritário. Tive a sorte de conhecer todos os meus avós, tanto do lado paterno como materno, e ainda conheci três bisavós da parte do pai e três bisavós da parte da mãe.

Os avós são segundos pais, educam-nos ao mesmo tempo que têm como missão “estragar” os netos. As avós são uma fonte ilimitada de meias de lã quentinhas e vestidos que fazem com carinho. E com as avós aprendi a fazer crochê e a beber café com bolachas Maria, porque queremos ser crescidos como elas. E os avôs ensinam a apanhar fruta e a cuidar dos animais. Dos avós podemos sempre contar com uma comida extra quando não gostamos daquela que eles fizeram, de uma nota no nosso aniversário que eles nos entregam como se fosse contrabando e, aquilo que mais valorizamos quando crescemos, as histórias daquilo que já viveram.

No entanto as diferenças geracionais fazem-se sentir nos encontros de família quando falamos de temas mais sensíveis e, quando é política, aí vem ao de cima os defeitos genéticos herdados dos avôs que com um temperamento mais agitado nos faz saltar a tampa. E é assim, nas discórdias que vemos o quão parecidos somos, mesmo que, nem sempre nos compreendamos, pois são épocas e experiências diferentes.

Acima de tudo, os avós são o conforto, o sabor a casa e sobretudo lições de vida. Aprendi muito com todos os meus avós e tenho um bocadinho de todos eles. A vida moderna agitada e o trabalho dos pais, torna os avós e até os bisavós em figuras essenciais na nossa infância.

A minha bisavó, hoje com 87 anos, é um dos maiores exemplos de força que conheço. Aos sete anos não só cuidava dos irmãos, como também começou a trabalhar a tomar conta de outras crianças. Numa época em que ir à escola era coisa de ricos, ficou por concretizar o sonho de saber ler e escrever. Criou sozinha três filhos, pois o marido morreu ainda muito novo, depois criou ainda sete netos, e mais tarde, sete bisnetos, nos quais me incluo. Uma história marcada pelas atrocidades da vida, muito trabalho e nenhum descanso, mas onde o que mais se evidencia é a vontade de ajudar todos aqueles que são também parte dela. Um daqueles espíritos de mulher independente, que não há contratempo que abale, ensinou-nos o que é ser uma família, amar e proteger aqueles de quem gostamos.

Se há coisa que se aprende com os avós é que a vida não é fácil, mas que isso não é desculpa para não sermos o melhor possível. E todas aquelas histórias que nos gostam de contar junto ao calor da lareira, e que na altura nem ligámos muito, vêm-nos à memória sempre que a vida se torna mais complexa ou a nostalgia ataca. E aprendemos que a nossa vida é mais fácil do que a deles foi e que no final do dia, tudo passa e tudo se consegue.

Inês Carpinteiro

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