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As realidades dos Festivais de Música Portuguesa

À medida que reflito nos meus mais de 29 anos de envolvimento na promoção e organização dos principais festivais e concertos da comunidade portuguesa em Ontário, são muitas as memórias e as conquistas de cada um, apesar do sentimento de missão cumprida, também encaminham para um elemento de realidade, do quão difícil é conseguir fazer as coisas.

Em 1990, durante os meus primeiros anos como representante do Labatt, eu estava entusiasmado por marcar presença e estabelecer visibilidade em toda a comunidade. As celebrações da Semana de Portugal, organizadas pela Aliança dos Clubes e Associações Portuguesas em Ontário (ACAPO), eram o maior evento de representação da cultura portuguesa no Canadá, ao mesmo tempo que providenciavam uma grande oportunidade de promoção dos produtos Labatt. Portanto, seria a plataforma perfeita para estabelecer e conquistar os meus objetivos e criar visibilidade para as marcas Labatt/ Carlsberg, o que era necessário para obter sucesso no mercado. Tudo começou no Trinity Belwoods Park com os GNR e o Fernando Pereira.

No início dos anos 90, enquanto trabalhava como um dos principais patrocinadores da Semana de Portugal, acompanhado por um pequeno grupo incansável de diretores da ACAPO, conseguimos criar excelentes festivais de música no Trinity Bellwoods Park e/ ou no Ontario Place Forum, com a presença do José Cid, Xutos, Marco Paulo e Jorge Ferreira. Não foi até me tornar Presidente da ACAPO, em 1997, aquando a celebração do 10º aniversário da Semana de Portugal, que tudo começou a atingir níveis de credibilidade superiores e um elevado nível de participação da juventude. E com isso a exposição financeira aumentou também.

Coincidentemente, até então eu tinha colaborado com a CIRV FM e tinha trazido experiências musicais únicas aos melhores locais de concertos da cidade de Toronto, desde Dulce Pontes no Roy Thompson Hall, a Madredeus no Massey Hall. Todos os grandes marcos e conquistas da comunidade…

Depois chegou a Primavera de 1997, a minha vida e a minha apreciação pelo cenário da música portuguesa excederam-se para sempre, e foi aí que fiquei nos 20 anos seguintes, fixado na ideia de fazer maior e melhor, colocar as celebrações da Semana de Portugal em Toronto a par com as celebrações de Paris e de Newark, em New Jersey. Para que eventualmente, a semana de Portugal de Toronto se tornasse numa das maiores celebrações do Dia de Portugal, em qualquer lado do mundo, incluindo em Portugal. Em 1997, o 10º aniversário ofereceu uma programação de ícones da música portuguesa inimaginável, desde Pedro Abrunhosa a José Cid, e ainda, Luís Represas, Trio Odemira e Santos e Pecadores. A semana de Portugal em Toronto, em 1997, foi a inveja daquilo que de melhor os festivais de música portugueses tinham a oferecer. O sucesso desse ano abriu portas a novas possibilidades, enquanto que logisticamente se começava o fim dos eventos “Festivais comunitários gratuitos”. Eventualmente a organização, o risco financeiro e a burocracia, tornaram-se demais.

Ao longo dos mais de 19 anos seguintes, os principais nomes da música portuguesa passaram por Toronto e as nossas celebrações tornaram-se o assunto dos festivais de música em Portugal Todos queriam estar nos palcos do Trinity Bellwoods Park, mais tarde do Downsview Park e nos últimos anos, no Earlscourt Park. Das muitas e incríveis atuações do Rui Veloso, José Cid, Polo Norte, Paulo Gonzo, Delfins, The Gift, Amália Hoje, Ana e José Malhoa, Quim Barreiros, Augusto Canário, Moonspell, Paulo Praça, The Fevers, Jorge Ferreira, UHF, Paulo Bragança, Shawn Desman, Keshia Chante, Brian Melo, Danny Fernandes, Tyler Mederios, Amor Electro, Xutos, e ainda o incrível concerto de uma vida, em 2017, com os Resistência, foi o auge para a minha despedida. O sonho concretizou-se. A missão foi cumprida. O que se poderá seguir?

Não nego que os últimos 20 anos de festivais deixaram memórias incríveis, já que cada Semana de Portugal era como se fosse o nascimento de um filho. Todas elas tiveram obstáculos para superar e muitos dias difíceis para organizar. Desde o peso financeiro/ de patrocínios, de “onde viriam os fundos” para pagar projetos tão grandiosos. No início dos anos 90, os orçamentos anuais das celebrações da Semana de Portugal passaram de $180,000 a mais de $500,000 nos últimos anos. As celebrações do Dia de Portugal tornaram-se na Semana de Portugal, e eventualmente no Mês de Portugal em Ontário. Eram vários os eventos ao longo desse mês, a exigência financeira continuou a crescer com o passar dos anos. No início dos anos 90, o peso do patrocínio caía em grande parte sobre o Labatt. Em 1999, quando o Labatt se decidiu afastar, direcionámos a nossa atenção para as instituições financeiras da comunidade, desde os principais bancos canadianos a branchs com representantes portugueses.

Durante a maior parte do início de 2000, eles eram a principal linha de respiração. Com a queda económica de 2007, esse mercado secou e precisámos novamente de alterar a nossa direção para manter a Semana de Portugal viva. Para nossa salvação, veio a LiUNA e a crescente indústria de construção portuguesa. Proprietários individuais e líderes empresariais acreditaram que a Semana de Portugal merecia o seu apoio e proteção. Esta indústria e o esforço da LiUNA conduziram as celebrações ao seu auge de sucesso. Além disso, a ACAPO foi sempre apoiada por empresas icónicas como a Caldense, Crawford, Ferma, Global Waste, Limen Group, Lions Group, Swiss Chalet e Viana, apenas para mencionar alguns. Apoiaram consistentemente a “Nossa Comunidade”, ano após ano…
Se não fosse a tensão de onde viria o apoio e o crescimento dos orçamentos anuais, eram os desafios das políticas burocráticas. E foi aqui que os diretores, voluntários e sim, eu que estava a liderar o grupo, sentimos o maior impacto na nossa moral. Durante mais de oito anos, nós combatemos a pressão de abandonar Trinity Bellwoods Park. Eventualmente um grupo de residentes mobilizou-se para criar um novo estatuto da cidade, onde os cães tinham prioridade no uso do Parque e nós fomos obrigados a sair. Encontrámos uma localização temporária no Downsview Park, mas mesmo com o sucesso da organização pela primeira vez de uma Tourada ao vivo, ao estilo português, a comunidade não estava preparada para aceitar a mudança e distância do evento. Por isso, instalámo-nos no Earlscourt Park, devido ao apoio do local councillor Palacio, que lutou para nos garantir esse acesso. Em 2017, com as maiores celebrações de sempre a marcar o 30º aniversário, com os Xutos e Resistência, enquanto que estávamos a ser processados pela cidade por queixas relativas ao barulho e tive pessoalmente de enfrentar acusações e multas. Foi a gota de água. Era tempo de ter outra pessoa a liderar…

Este resumo histórico serve apenas para comunicar a muitos de vocês que acreditam que todas as Semanas de Portugal foram um ‘mar de rosas’ e simples de concretizar. Não foi fácil e o impacto negativo que teve em muitas das nossas vidas irá permanecer para sempre.

José Maria Eustáquio

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