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A moda milenar que chegou para ficar: Tatuador Ricardo de Souza fala dos desafios da profissão

Hoje em dia é muito difícil não encontrar uma pessoa que não tenha uma tatuagem, principalmente na geração mais nova. Existem as coloridas, pretas, gigantescas, ou apenas um detalhezinho – o fato é que a tatuagem é uma moda que cresce cada vez mais. Mas essa moda é mais antiga do que se pensa.

Os primeiros registros datam de 3370 a 3100 antes de Cristo. A descoberta desta data veio do achado de Otzi, ou a múmia do Smilaun, um fóssil humano encontrado nos alpes, que continha 61 tatuagens, o que pode identificar uma relação entre essa prática de cura ancestral por meio da tatuagem, assim como denotar um uso medicinal dos desenhos marcados na pele.

As primeiras tatuagens eram feitas, principalmente, por meio do uso de instrumentos feitos de ossos e aplicação de tinta vegetal nas camadas mais superficiais da pele, numa técnica muito parecida com a Stick and Poke Tattoo, cada mais popular na atualidade.

Geralmente, a tatuagem é uma forma de expressar na pele a sua personalidade, ou algum momento e/ou pessoa que foram marcantes na vida.

Fomos às ruas saber o que as pessoas acham desses traços pelo corpo.
O Moose, que mora em Toronto há alguns anos, disse que tem uma tatuagem bem escondida porque sabe que tem algumas pessoas que não aceitam muito bem. Na sua opinião, o significado da tatuagem é para que não se leve a vida tão a sério.

Já para Naria, da Ucrância, a tatuagem não é algo legal, porque ela acha que essas marcas são muito agressivas e, além disso, as pessoas mudam de opinião, de personalidade e podem se arrepender de terem feito esses desenhos permanentes.

A Renne Mcaairter, que tem algumas tatuagens, disse que elas representam diferentes momentos e eventos da sua vida, e não tem medo de se arrepender em tê-las feito, pois pensou bastante sobre isso.
Nós fomos num estúdio de tatuagem conversar com o profissional Ricardo de Souza para saber mais um pouco sobre a sua profissão e seus desafios.

Ricardo tem 31 anos, e é especialista em tatuagens tradicionais, com ênfase na cultura pop e cultura nerd. Ele começou a desenhar desde cedo e é especialista em desenhos de animação. Se dedica consistentemente em desenvolver seu conjunto de habilidades e é um profissional curioso, criando sempre novos designs personalizados com base nas ideias das pessoas que o procuram para tatuar.

Milénio Stadium: Quando e como você iniciou sua carreira?
Ricardo de Souza: Eu comecei quando eu tinha 28 anos, mas eu descobri que queria ser tatuador dois anos antes. Eu senti uma certa dificuldade, porque tatuar não é uma coisa que você vai na escola e aprende, é preciso muita pesquisa e conhecer pessoas da área. Desde então eu tenho trabalhado em três estúdios diferentes.

MS: E como foi a sua primeira tatuagem? Existiu algum tipo de tensão?
RDS: A primeira vez que eu fiz uma tatuagem foi na minha própria pele. Foi uma grande surpresa, porque quando o meu mentor percebeu que eu já estava pronto, ele falou que já poderia tatuar em mim mesmo, e ficou me observando o tempo todo e claro, quando necessário, me conduzia em relação aos traços. Tatuei na minha própria perna. Tinha que ficar dobrando pra tatuar, e foi bem dolorido, não por causa da agulhas, mas porque tive que ficar duas horas com ela dobrada, e sentia ela adormecendo. Estava bem nervoso e a todo momento perguntava para o meu mentor se estava fazendo direito. Mas foi divertido, eu estava muito feliz.

MS: Os tatuadores geralmente tem uma preferência de traços e desenhos. Você tem uma preferência também? Qual o tipo de tatuagem que você mais gosta de fazer?
RDS: Eu prefiro as tatuagens tradicionais. Eu gosto muito do “old style”, estilo do tatuador Sailor Jerry, porque esse foi o meu início. E agora estou partindo para algo novo, mas trazendo comigo essas origens. Eu também gosto de tatuagens no estilo “comic books” e videogames.

MS: Qual foi o pedido mais estranho que você já recebeu?
RDS: Para ser honesto, ninguém nunca me pediu nada estranho. Eu já ouvi muitas histórias a respeito, mas pessoalmente, nunca aconteceu. Quem sabe mais pra frente?

MS: E qual foi a mais complexa?
RDS: Provavelmente foi uma que eu fiz na costela de um mulher. Foi uma pintura de Salvador Dalí. Foi trabalhosa porque tinha diversas linhas, pedaços do desenho com movimento. Além disso, tatuagem na costela é uma das partes mais doloridas, a pele é muito difícil nesta região. Você tem que tomar muito cuidado, e deixar a pele muito bem esticada. Então com certeza, essa foi uma das mais difíceis. Se tiver paciência, tudo fica bem.

MS: Você acredita que tem idade certa para fazer uma tatuagem?
RDS: Definitivamente, sim. Eu gosto das regras de agora, em que a idade mínima para se fazer são os 18 anos. E também acho que as pessoas que querem um grande desenho têm de esperar pelo menos até atingirem uns 20 anos. Percebo por mim – eu queria um monte de tatuagens quando eu era muito jovem, e hoje em dia eu não quero mais. E fico feliz que não as tenha feito naquela época. É bom que as pessoas pensem muito bem antes de tomar essa decisão. Maturar a ideia é importante.

MS: Quais são as recomendações que você indica antes de se fazer uma tatuagem?
RDS: Eu acho importante enfatizar que a tatuagem tem que ser algo que tenha um significado muito forte para a pessoa – talvez algo que envolva família, pessoas que amamos que já faleceram, geralmente são boas ideias. Se passar um ano ou dois e a pessoa ainda goste da ideia, provavelmente é isso que ela tem de fazer na pele. Contando que tenha significado, a pessoa não irá se arrepender.

MS: Sabemos que o preconceito tem diminuído cada vez mais, mas ainda existe. Porque você acredita que tem algumas pessoas que insistem em julgar as outras por conta da tatuagem?
RDS: Eu acredito que pelo fato do que a tatuagem representava no passado. Existiu uma época em que poucas pessoas as tinham e eram consideradas de “má índole”, como ladrões, prostitutas, desleixados. Então essas pessoas que julgam agora, provavelmente conectam tatuagem com crime. Mas hoje em dia essa arte é cada vez mais normal, muitas pessoas que as têm são inteligentes e bem sucedidas. A tatuagem é só uma arte.

MS: E você já sofreu algum tipo de preconceito em relação a sua profissão?
RDS: Acho que não. Eu vivo numa cidade onde as pessoas têm a mente aberta. Toronto é muito positiva neste sentido. Então, pessoalmente, nunca sofri. Eu vou viajar para um outro país bem diferente agora, vamos ver como vai ser por lá.

MS: Quantas tatuagens você tem?
RDS: Talvez umas 24. Parei de contar. E ainda quero fazer mais.

MS: Para uma pessoa que quer fazer uma tatuagem, tem de ser observado algo muito importante que é a higiene do local. Quais as dicas para perceber se esse local é seguro?
RDS: Eu diria para a pessoa dar uma boa olhada no local como um todo e observar se está tudo limpo. Se o chão e/ou os banheiros estiverem sujos, já é um sinal de que o local não é adequado. É importante sim observar o trabalho do tatuador, mas ele pode ter o melhor traço mas se algo estiver contaminado, provavelmente a pessoa vai ficar doente. Eu acho que isso é o mais importante, a limpeza.

MS: E você tem algum sonho que você queira realizar profissionalmente?
RDS: Minha mente está sempre aberta para novas ideias, mas neste momento eu quero imprimir o meu estilo, minha marca, minha assinatura, e quando isso estiver mais palpável, provavelmente novas ideias surgirão.
A tatuagem é uma arte extremamente antiga, bela e cheia de significados. É preciso muita coragem para colocar uma imagem no corpo de forma permanente. Precisamos começar a abrir nossas mentes para o respeito, porque ao que tudo indica, essa moda veio para ficar.

Adriana Marques

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