Opinião

O “desenrascanço” português!

Portugal é um país de grandes contrastes a que os portugueses se adaptam facilmente!

Há quem diga que isso faz parte dos genes dos portugueses, atribuindo à nação e ao seu povo uma característica única, capaz de superar maiores dificuldades e provações do que outros mais desenvolvidos (vulgo ricos) que nós, não seriam capazes de ultrapassar.

Não irei tão longe na minha análise, embora não faltem razões históricas milenares para justificar o quadro real das situações pelas quais temos passado. A este propósito limitar-me-ei a considerar que somos um povo “desenrascado”, capaz de se habituar a viver menos mal ou menos bem e, poucos,… muito bem!

Como o povo não é algo homogéneo, capaz de ser definido por uma característica única ou estagnado, ou seja, que permanece igual a si próprio e sem qualquer evolução desde os afonsinos, teremos que ter em conta uma variedade de fatores que eventualmente possam caracterizar este nosso povo e ver se, entre eles, existe um elemento comum que possamos considerar como parte integrante da nossa maneira de ser.

Como antes afirmei, nesta mera hipótese académica, se há algo que se manifesta permanentemente na praxis deste povo é o “desenrascanço”. Mas não um “desenrascanço” qualquer, trata-se, no caso a que me refiro, de obter algo que, por via das regras estabelecidas, dificilmente se obteria ou que demoraria muito mais tempo a obter.

Assim ele, o “ desenrascanço”, é: insubmisso perante qualquer regra que lhe tentem impor à força ou por persuasão, mais escondido por força das leis e mais público por ausência ou imprecisão dessas mesmas leis; assumido para obter vantagens individuais ou de grupo, ou dissimulado e hipocritamente condenado por prejudicar outros.

Neste âmbito cabem as mais variadas e criativas atitudes, que vão desde os pagamentos a “negro”, “luvas” ou “caixas de robalos”, por serviços de conveniência, a simples atos de ostentação, obtidos por conhecimentos com pessoas chave no resultado final, ou incongruência, tendo em consideração os seus reais rendimentos e capacidades individuais, passando por um sem número de outras “espertezas” com as mesmas características.

Curiosamente, os praticantes desenrascados destas habilidades, são aqueles que, por não conseguirem realizá-las quando delas precisam, criticam asperamente os que as conseguem executar, gritando que o sistema os prejudica!…

Encontrar maneira de não pagar impostos é, salvo as honrosas excepções morais e obrigacionais, uma característica generalizada entre os portugueses que tem, na nossa longa história de séculos, razões da sua origem. No entanto, no momento presente da nossa sociedade em que são claros os dispositivos de aplicação desses mesmos impostos, muitos dos que “escapam” aos impostos, manifestam-se nas ruas ou nos seus gabinetes de direção, contra a carência dos apoios sociais ou a redução dos seus lucros nos negócios.

Neste contrastante mundo português, em que a ação política é feita com base nas publicações das primeiras páginas dos jornais e abertura dos telejornais televisivos, é frequente assistirmos a reportagens, estatísticas, testemunhos e comentários sobre a pobreza ainda existente no país, sobre o baixo nível dos nossos salários ou as deficiências do nosso sistema de saúde, de educação ou de transportes, raros são aqueles que fazem um razoável diagnostico das situações. Por isso, um qualquer observador externo, que “caia” neste momento em Portugal, deve interrogar-se sobre: como é que ainda com tantos pobres e baixos salários, os portugueses se atropelam nas compras em centros comerciais durante o “Black Friday” e o Natal; como é que com tantas dificuldades económicas e críticas ao sistema de saúde, tantos portugueses ocorrem aos hospitais privados; como é que com tantos problemas na área da educação, alunos e professores fazem tantas greves; como é que com tantas deficiências apontadas aos transportes e graves dificuldades económicas dos seus prováveis utentes, as nossas autoestradas se enchem de viaturas topo de gama, mais parecendo que nos encontramos em rodovias alemãs e por fim, ou melhor, “por agora”, como é que num país com tão baixos rendimentos per capita há tantos concertos musicais caros, com artistas de topo, esgotados antecipadamente por muitos milhares de entusiastas.

Claro que, para todas estas questões interrogativas há razões subjacentes, umas melhores e outras piores, no entanto e tal como referi, isto é um ponto de vista de um observador externo, um “estrangeiro” que nos faça uma visita citadina porque, se sair do meio urbano e dê uma volta pela Beira Interior ficará assustado com o contraste, ou encantado com a paisagem que não tenha ardido, a vida saudável e longevidade das suas gentes e a excelente culinária portuguesa, muita dela herdada dos pobres marinheiros das seculares naus. E, quem sabe, cansado da sua agitada e controlada vida urbana, o “estrangeiro” decida instalar-se no local.

Pode-se até pensar que todas estas contradições nacionais e de comportamento de muitos dos nossos cidadãos tem origem na presunção de que o importante é vender imagem, cá dentro e lá fora, mesmo que isso nos force a passar por dificuldades pessoais e nos atire coletivamente para a “fossa” da bancarrota. Mas também já somos experientes nessa matéria e ultrapassámo-la várias vezes, porque não tentar mais uma vez o “chapa ganha, chapa gasta”, agora que temos mais uns “tostões” e pouco desemprego. 

Não há contrassenso nenhum nestas antinomias. Nós somos assim porque…somos “desenrascados”!

Nota: este texto é feito num estilo caricaturesco e gracejador. Espero que os leitores compreendam.

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