Luís Barreira

Que Portugal temos e queremos?

A progressão do nosso desconfinamento “português suave”, pese embora algumas travagens bruscas em certas zonas e localidades do país, cujos índices pandémicos estão acima dos valores razoáveis, começa a fazer crescer a expectativa de atingirmos o final desta “reclusão” forçada a que os cidadãos e empresas têm estado sujeitos e, com ele, surge o interesse em perceber a realidade nacional e as consequências produzidas pela pandemia no nosso tecido económico e social.

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Créditos: DR.

Para além de outras entidades e organizações estatais ou privadas, nacionais e internacionais, que se dedicam ao estudo destes fenómenos, a prestigiada Fundação Manuel dos Santos tem vindo a promover um conjunto de investigações e debates sobre estas matérias, que gostaria de salientar.

Um estudo sobre a atual pobreza em Portugal, muitas vezes dissipada (para não dizer escondida…) pela apresentação dos resultados médios facultados pelos procedimentos das organizações internacionais (duas pessoas comem um frango logo cada uma como metade, esquecendo que, porventura, uma apenas come uma asa…), revelou que, em Portugal, mais de metade dos trabalhadores são pobres! Concluiu igualmente que se não fossem os subsídios e apoios sociais que possam receber, passariam fome!

Esta dramática realidade que a pandemia agravou, trazendo para a pobreza aquilo a que se chamou os “novos pobres”, não é apenas um elemento ocasional, mas sim estrutural da nossa sociedade, comprometendo todas as campanhas que, ao longo dos anos, têm sido anunciadas para reduzir a pobreza no país e cuja metodologia aplicada apenas a tem perpetuado.

O referido estudo, refletindo ainda sobre este problema estrutural e com base nos dados recolhidos, indica que a pobreza se agrava sobretudo por três fatores, identificados como os “três dês”: desemprego, doença e divórcio. Consequência da perda de rendimentos pelo desemprego e pela doença de quem é o principal contribuidor do orçamento familiar e nos casos de divórcio, empobrecendo as famílias monoparentais e com mais de três filhos.

Ao revelar que a pobreza no país é um fator geracional, transmitindo-se de pais para filhos e destes para netos, cuja origem se inicia na infância das crianças de famílias pobres e de baixa escolaridade, independentemente das leis existentes exigirem a continuidade dos estudos, esta situação é bem demonstrativa da inexistência de um eficaz elevador social (são necessárias cinco gerações para conseguir sair do estado de pobreza), para que se diminua o atual estado de coisas.

A falência e a fragilidade de todas as políticas anti pobreza que têm sido praticadas por sucessivos governos portugueses, através de apoios sociais, têm apenas obtido magros resultados ao nível da superação de algumas das maiores necessidades básicas das famílias, mas tem igualmente produzido o efeito perverso de as manter no estado de pobreza.

Bem certo que este é um problema complexo de resolver, razão pela qual e pelas próprias experiências anteriores não pode ser tratado unicamente na esfera da segurança social, mas sim num âmbito multidisciplinar que envolva igualmente: a saúde, a habitação, a educação, o rendimento do trabalho, a mobilidade, a família, entre outras áreas da sociedade que condicionam a evolução social dos cidadãos.

Considerando, como inicialmente disse, a dimensão económica da realidade existente e excluindo por agora as múltiplas vertentes do que nos espera com o ansiosamente aguardado (…) fim do confinamento, ressalvo uma condicionante que, pela sua dimensão e proximidade, terá evidentes consequências na nossa sociedade de cidadãos e empresas.

Trata-se do anunciado fim das moratórias, aguardado para o próximo outono, que tem proporcionado aos cidadãos e às empresas a suspensão de pagamentos de rendas, empréstimos, impostos e outras dívidas, por um período transitório e que deverá terminar em setembro/outubro, obrigando aqueles que a este crédito recorreram vir a ter de pagar todas as suas dívidas em atraso.

Os bancos têm chamado repetidamente a atenção do Governo para este assunto, ainda sem resposta, para as repercussões socioeconómicas que a sua resolução implica. Espero que daí não resulte mais uma crise semelhante à de 2008 (desta vez não por culpa do setor bancário…) que coloque os cidadãos e as empresas à beira de sucessivos problemas não resolvidos.

Não sei se os milhares de milhões de euros que vão ser dados e emprestados a Portugal pela União Europeia, se o Tribunal Alemão der o seu voto favorável (…) e as regra estabelecidas o permitirem, poderá suprir ou amenizar este eventual problema em todas as suas dimensões mas, sendo um dos propósitos desses meios financeiros permitir aos países investir numa economia sustentável, espero que a maior parte da sua aplicação em Portugal não vá para o setor turístico, negativamente caracterizado como auto-sustentado durante esta pandemia (desemprego, salários baixos e pobreza) e sem dispormos de uma visão de um futuro idêntica àquela que já nos aconteceu antes da Covid-19. O vírus tem modificado muito a forma de estar e gostar dos cidadãos no mundo, alterando até o seu “apetite” turístico. 

Portugal tem um tecido económico frágil e carente, o que propicia vontade e inteligência nos investimentos a fazer e no combate às grandes assimetrias geradoras de pobreza.

Que o conhecimento e a audácia iluminem os nossos decisores!

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