Carlos Monteiro

Já que somos nós a pagar, exijo que se limpe em condições!

Novembro trouxe consigo a primeira neve do ano, anunciando assim o inverno que se avizinha. Os 15 cm de acumulação de neve previstos durante quase uma semana para o dia 11, acumularam-se um pouco por todo o lado.

Com eles vieram os problemas característicos num país que, segundo querem fazer crer, está habituado aos longos invernos e grandes precipitações. Principais vias rodoviárias entupidas, transportes públicos rodoviários caóticos, acidentes ao virar de qualquer esquina, estradas e passeios em condições que apenas seriam explicáveis num país localizado na África Austral, que apenas vê neve nas eras glaciares, e que apenas conhecemos dos livros de escola e dos programas do National Geographic.

Se por um lado não é compreensível que os senhorios não providenciem serviços de limpeza das suas propriedades e que os condutores não tomem precauções com os veículos, instalando pneus de inverno, ou na maneira como conduzem, de acordo com as condições climatéricas, também não é admissível que as Câmaras Municipais e os governos provinciais não diligenciem no sentido de termos estradas, ruas, vias para bicicletas e passeios em condições de segurança, especialmente quando a tão esperada queda de neve foi anunciada com tanta antecedência.

A Cidade de Toronto gasta anualmente entre 90 e 100 milhões de dólares na limpeza das ruas e passeios da cidade. A anexação dos municípios de York, East York, North York, Etobicoke e Scarborough à então velha Cidade de Toronto, em 1998, formando a Cidade de Toronto, tal como hoje a conhecemos, deixou áreas hoje fortemente populacionais sem qualquer plano digno de limpeza e remoção de neve. Esses municípios tinham até então os seus próprios planos de limpeza, na sua grande maioria mecanizados, que continuam ainda hoje ativos. A Cidade de Toronto por seu lado, não soube atualizar o plano existente e são hoje muitas as áreas que não têm limpeza de ruas e passeios eficaz. Em North York, onde resido, no inverno de 2019, demorou, na grande maioria das vezes que nevou, mais de 24 horas para ter a rua limpa e a acumulação de gelo foi tal, que só no final da estação se voltou a ver a cor do alcatrão, sinal que não houve aplicação de sal ou outro qualquer produto para descongelamento do gelo que se instalou no pavimento.

Há quem diga que é um fenómeno próprio do Canadá, país que foi aprendendo a viver com os invernos rigorosos. Recomendo vivamente uma visita aos países do norte da Europa para perceberem que estão redondamente enganados. Os exemplos seriam muitos, mas basta enunciar os sistemas de irrigação de líquido anticongelante automático das autoestradas. Não se consegue perceber como é que as autoestradas do Ontário, algumas na lista das autoestradas com maior tráfego da América do Norte, alvo de reparações constantes (assunto que também merece ser abordado no futuro), não estão equipadas com tais mecanismos.

Mas será que existe alguém mesmo interessado em resolver estes problemas? A primeira questão que se levanta é tentar perceber porque razão os senhorios são multados por não limparem os passeios das suas propriedades e as Câmaras Municipais e os governos municipais nunca são responsabilizados pelo fraco desempenho na manutenção e limpeza das estradas e passeios. Não encontrei explicação.

Desengane-se quem ache que estamos no caminho certo. Nos primeiros dois meses de 2019, a cidade de Toronto recebeu cerca de 20.000 queixas relativas à limpeza de neve e salinização das estradas. Um aumento de 185% relativamente ao ano transato.

Mas os problemas não são só as queixas. Um olhar mais atento a este fenómeno climatérico deixa-nos ainda mais preocupados. Um relatório de 2016 do Toronto Public Health indicou que as visitas aos hospitais, decorrentes de quedas e incidentes na neve e gelo naquele ano, custaram ao sistema de saúde cerca de 4 milhões de dólares e 6.7 milhões de dólares em processos de indemnização às companhias de seguro.  Os números nas outras cidades e províncias não são muito diferentes, sendo óbvio que os orçamentos são sempre curtos para fazer face às intempéries de inverno.

Outra questão é perceber quem realmente paga por esta incompetência. Não são os governos provinciais ou as companhias de seguro, mas sim o cidadão com os seus impostos e os usuários dos seus serviços, levando a preços de seguro no limiar do insustentável para a maioria dos habitantes desta província.

Mas não ficamos por aqui. A falta de limpeza de estradas interessa definitivamente a muita gente. Pergunto:

Quanto milhões de dólares circulam no Canadá devido aos acidentes que ocorrem em dias de temporal?

Qual o volume de negócios das empresas de reboques, oficinas e fábrica de peças automóveis de automóveis e serviços indiretos?

Qual é o valor em impostos que os diversos níveis de governo arrecadam com estes negócios?

É fácil perceber que a neve é um negócio de milhares de milhões no Canadá suportado integralmente pelo consumidor final e cidadão através dos impostos.

Se é verdade que a Câmara de Toronto e o Governo do Ontário, nos últimos anos, tem multado as empresas que demonstraram fraco desempenho nos serviços de limpeza e remoção de neve na cidade, também não é menos verdade que a situação não melhorou.

A desresponsabilização por parte das Câmaras Municipais e governos provinciais das suas tarefas de governação é assustadora. Infelizmente, neste, como em muitos outros casos, só há uma parte interessada em realmente ver o problema resolvido… o comum do cidadão.

Não se pode tolerar que as autoestradas da província sejam um verdadeiro caos cada vez que neva, sem que sejam aplicadas medidas preventivas quando se anunciam 15 cm de neve com uma semana de antecedência. Não se entende que os autocarros fiquem parados no meio da rua sempre que neva nesta cidade e é inexplicável que ruas, portas e passeios que ladeiam escolas não sejam limpas e que apresentem acumulação de gelo quase até ao final do inverno.

Definitivamente não aprendemos a viver com os invernos longos e rigorosos. Apenas aprendemos a ser condescendentes com a incompetência das câmaras municipais e governos.

Já que somos nós a pagar, exijo que se limpe em condições!

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