Opinião

A indispensável moral pública!

Sinto-me profundamente triste com muitos acontecimentos que afetam a imagem da nossa moral pública que ainda tento preservar. Sinto-me irritado com os escândalos, que chegam quotidianamente ao nosso conhecimento, sobre a perversão de amplos setores do nosso funcionalismo público e autárquico, a todos os níveis da nossa administração. Sinto-me revoltado pela ausência de verdadeiras medidas corretivas que combatam eficazmente a continuidade destes acontecimentos. Sinto-me finalmente apreensivo, sobre o desgaste que estas imoralidades na conduta destes setores socioprofissionais possam causar no descrédito do nosso sistema político, dando azo a todo tipo de críticos e movimentos, mais interessados na sua destruição do que na correção dos seus defeitos.

Bem sei que, felizmente, a imensa maioria dos muitos milhares de funcionários públicos e camarários não se revê nesta situação, mas basta que diariamente as primeiras páginas dos jornais e televisões publicitem acusações e condenações de fraudes cometidas por estes funcionários para se gerar uma onda de generalização na opinião pública e um sentimento de censura ao regime democrático em que vivemos.

Sempre que um funcionário público ou autárquico é intercetado numa prática fraudulenta, os cidadãos tendem a fazer um julgamento apriorístico, acusando simultaneamente a culpabilidade do agente infrator, os seus responsáveis diretos, os ministros respetivos e o governo, de serem “todos pão da mesma massa”, ou seja, todos “ladrões”! E, quando os julgamentos eventualmente os desculpabilizam, acentua-se a acusação ao sistema judicial e ao resto das instituições do Estado. Uma situação que enfraquece permanentemente o reconhecimento da honestidade dos detentores dos cargos públicos e da própria natureza da nossa democracia.

Mas também é verdade que os casos sucessivos e semelhantes de que vamos dando conta, quase que diariamente, começam a roçar os limites da decência e a compreensão de que se trata de uma mera pontualidade, causada pelo impróprio caráter de um qualquer funcionário. A vulgaridade destas graves situações, como a apropriação indevida de bens ou serviços por parte de alguns detentores de cargos públicos, faz-nos sentir o Estado e as suas respetivas instituições, como incapazes de controlar o desempenho dos seus agentes, como se vivêssemos num país de total impunidade.

Para inverter razoavelmente o atual quadro que nos é apresentado, a primeira deficiência a tratar é o da qualificação moral de todos aqueles que trabalham na administração pública, através de um processo de escolha e preparação para o cargo e para a representação dos valores morais e éticos, que devem prevalecer em quem assume um lugar no aparelho do Estado ou numa das suas autarquias.

A segunda intenção a exigir é a da profunda penalização de todos os infratores, com expulsão definitiva de todo o serviço público, no caso de provada culpabilidade dos arguidos. Não pode existir persuasão sem coação, independentemente das opiniões, das incursões filosóficas mais pacifistas ou de leis incapazes de cumprir a sua missão reguladora do bem público. A responsabilização penal de quem trabalha às custas do resto da sociedade tem de ser desmotivadora do crime e um incentivo de dedicação à causa pública, para que os serviços e as pessoas que nele intercedem possam ser melhor apreciados por quem lhes paga!

Outra das condicionantes que a atual situação provoca é o aparecimento de movimentos políticos populistas, normalmente apoiados nas falhas dos sistemas democráticos, para propagandear um conjunto de propostas de regimes autoritários, que têm como objetivo limitar as nossas liberdades individuais, abrindo caminho para novas ou velhas ditaduras, ao serviço de classes dominantes. A corrupção nos cargos públicos, que tem sido a bandeira de luta propagandística destes movimentos, na sua versão atual, é o denominador comum da sua ação crítica à governação dos nossos sistemas representativos, tentando captar o apoio popular com medidas que, apenas aparentemente, são favoráveis às massas populares.

Se bem que Portugal e os seus cidadãos tenham resistido às intenções destes movimentos, não é claro que, se continuarmos a assistir às deficiências das nossas instituições e à tolerância com que são tratados juridicamente os casos de corrupção, a sociedade reaja de forma diferente, aceitando os que se anunciam como “paladinos da justiça”. Situação que se agravará se, porventura, o país derrapar para uma qualquer crise económica que afete a vida e o bem-estar dos seus cidadãos.

Reconhecendo que o funcionalismo público e autárquico não é mais do que o espelho do resto da sociedade, faltaria ainda falar sobre as causas dessas infrações morais que nos afetam a dignidade do Estado. Noutro espaço podemos aflorar como o desenvolvimento económico, político e social, tem vindo a abdicar de uma escala de valores e comportamentos éticos que julgávamos imutáveis e consistentemente valorizados na sociedade que estamos a construir.

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