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A revolução das sardinhas contra o discurso populista

“Sem bandeira, sem partido, sem insultos. Criem a vossa própria sardinha e participem na primeira revolução piscícola da História”. Era preciso dizer originalmente a rejeição dos discursos de ódio e do ultranacionalismo com laivos de fascismo que têm crescido em Itália.

Quatro amigos de Bolonha – Mattia Santori, Giulia Trappolini, Roberto Morotti e Andrea Gareffa – acharam que a ida àquela cidade de letras do líder da extrema-direita italiana, Matteo Salvini, no dia 14 de novembro, seria a oportunidade perfeita. Apareceram umas 15 mil pessoas, munidas de sardinhas. Um mês depois, já reuniram mais de 300 mil pessoas em protestos espalhados, o último deles no sábado, em Roma, com 40 mil sardinhas.

Mas porquê a sardinha? Por ser um “peixe humilde”, perfeito para simbolizar a classe trabalhadora. Por estarem apertadas em latas, perfeitas para simbolizar que se encham praças contra a extrema-direita. Por serem peixes, logo, silenciosos, em contraponto aos comícios-festa de Salvini. O mote é pacífico, canta-se muito o hino de resistência antifascista “Bela Ciao” e estão proibidos os insultos. “Nunca tinha visto uma manifestação que apela ao civismo”, disse até o antigo primeiro-ministro e antigo presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi.

“Queríamos tirar de casa a população que já não se mostra, crítica e indignada, mas não resignada”, justificava então Giulia Trappolini, citada no “Le Monde”.

40 mil em Roma

A manifestação de Roma cumpriu o objetivo: encher uma das maiores praças da cidade, em frente à Basílica de São João de Latrão. “Parece atingido”, diziam no sábado os organizadores. “Corremos um risco, o de se acreditar que as sardinhas sejam a solução para todos os males. Mas as sardinhas não existem. São pessoas que enchem o espaço público com as suas ideias e veem um inimigo: o pensamento único simplificado do populismo”, disse Santori às 40 mil pessoas que o ouviam.

Trata-se de “fazer emergir uma nova energia através de uma forma bem mais livre e espontânea” do que um partido. Mas com propostas e um programa já definido: fazer ondas na campanha para as eleições regionais na Emilia-Romanha (bastião da Esquerda italiana cuja capital é Bolonha e que, segundo as sondagens, pode passar para a Liga de Salvini, na oposição desde que rompeu a coligação com o Movimento 5 Estrelas, M5S antissistema).

Nos encontros, leem-se trechos da Constituição. Na lista de exigências, diz-se que a violência verbal merece o mesmo lugar da violência física na legislação penal e que deve ser excluída do tom dos discursos políticos. Diz-se que “os ministros comunicam unicamente pelos meios oficiais” e que deve ser transparente “o uso que a política faz das redes sociais”. E diz-se que deve ser revogado o decreto de segurança que Salvini assinou enquanto ainda era ministro do Interior e vice-primeiro-ministro que criminaliza o resgate de refugiados no mar

A mensagem foi compreendida. “Estamos aqui para dizer que a política do ódio não nos agrada, que gostamos da política virada para o futuro, que acolhe e não fecha portas”, dizia um manifestante de Roma citado na agência EFE. Da política, Nicola Zingaretti, secretária-geral do Partido Democrata que partilha o Governo com o M5S, antissistema, prometeu “fazer os possíveis para pôr em obra as propostas” das sardinhas.

Os quatro de Bolonha

Mattia Santori tem 32 anos, formado em Ciência Política, investigador em economia e treinador desportivo voluntário. É o porta-voz das sardinhas. Giulia Trappolini, 29 anos, é fisioterapeuta e instrutora de dança. Roberto Morotti, 31, engenheiro, trabalha no tratamento de resíduos e Andrea Gareffa, 32, é um guia turístico com formação em Ciências da Comunicação.

Salvini reage

“Deixemo-los com o ódio e o ressentimento, respondemos com um sorriso e a força das ideias”, respondeu no domingo Matteo Salvini, ilustrando com um vídeo de manifestantes a cantar “odeio a Liga”. Antes, reagira com imagens de gatos a comer sardinhas…

 

Jornal de Notícias

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