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Ilha de Moçambique

Ilha de Moçambique

Manuela Marujo

Estive a lecionar no sul de Angola de 1972- 1974. Na primeira oportunidade que me surgiu, decidi ir até à costa leste do continente africano para conhecer Moçambique. Quando era criança, o meu pai tinha-me contado que, em 1498, Vasco da Gama, o navegador alentejano de Sines, tinha descoberto uma Ilha ao norte deMoçambique, na sua viagem para a Índia. Na minha imaginação, esse lugar seria deslumbrante, com praias de águas transparentes e onde, no fundo do mar, abundariam enormes búzios de formas raras.

Nas férias grandes de 1974, viajei até à capital Lourenço Marques (hoje Maputo). Tinha uma amiga em Moçambique, cuja família me recebeu com grande hospitalidade. O pai era comandante da marinha e moravam perto do elegante Hotel Polana. Era nesse lugar privilegiado que frequentávamos a piscina, o bar, o restaurante e donde saíamos para passeios pela cidade com amigos jovens, a maioria oficiais da marinha. Em plena guerra colonial, não era visível, em Maputo, qualquer indício do conflito armado. A nossa ignorância sobre a realidade da guerra era chocante. Hoje sabemos que havia jovens da nossa idade a sacrificar as suas vidas enquanto nós, inconscientes do que se passava na mata, nos divertíamos.

Encantou-me essa cidade de edifícios modernos, avenidas amplas e costa com praias de água calma e convidativa. Notava-se influência da vizinha África do Sul, por exemplo, no hábito britânico de tomar chá em salões chiques, frequentados por pessoas muito requintadas. Quando comuniquei aos meus amigos que o meu plano era ir à Ilha, não ficaram muito entusiasmados, mas ajudaram-me a planear a viagem. Nessa época, as viagens de avião eram, de longe, as mais seguras. Comprei viagem para Nampula, via Beira. De Nampula, reservei outro voo, num avião bem pequeno, para o aeroporto da Ilha. Dali, era necessário atravessar a ponte de “rickshaw” ou a pé.

Foi emocionante conhecer a Ilha de Moçambique, a capital da colónia até 1898, considerada património da humanidade desde 1991. Com pouco mais de 3km de extensão, a Ilha estava dividida em três partes distintas: a norte, a colonial com a Fortaleza de S. Sebastião, o Palácio doGoverno e a Igreja do Baluarte; no centro, a árabe com mesquita e lojas indianas; a sul, a parte indígena com as casas macuti, com telhados de folhas espalmadas de coqueiro.

Alojada sozinha numa pousada sem fechadura no quarto, coloquei uma cómoda contra a porta, na primeira noite mas, receosa como estava, dormi sobressaltada. No dia seguinte, apercebi-me que as pessoas eram hospitaleiras, e se vivia em harmonia entre brancos, muçulmanos e nativos. Ao fi m de dois dias, já encontrava na rua caras conhecidas que me cumprimentavam. Caminhei pelo bairro indígena, e surpreendi-me com o costume das mulheres macua maquilharem as suas caras de branco; da mesquita ouvia o chamamento para a oração. Contudo, foi junto à fortaleza de São Sebastião, ocupada pelo exército português, que tive uma surpresa extraordinária. Ouvi chamar o meu nome e, a custo acreditei ver, correr para mim um antigo colega de Faculdade, de um grupo de rapazes em uniforme, que cumpriam o serviço militar na colónia. A alegria do encontro e o abraço de amizade que trocámos, sob tantos olhares de estranheza, ficaram para sempre marcados no meu coração.

Obtive, na Ilha deMoçambique, algumas conchas invulgares, das recolhidas pelos pescadores e vendidas na praia a preços irrisórios. A minha vida deu muitas voltas, mas continuo a utilizar, como objeto decorativo, um dos búzios moçambicanos que me faz evocar essa viagem memorável.

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