Açores

Turismo- “Estamos muito longe da saturação”

Entrevista a Mário Fortuna, Presidente da Câmara do Comércio de Ponta Delgada

Os últimos números do turismo revelam que as dormidas na hotelaria estão a abrandar e as no alojamento local a aumentar substancialmente. Podemos ter aqui um sinal de que já temos hotéis suficientes?

A leitura não é necessariamente esta. Acho que o que está a acontecer é que o alojamento local está, nesta fase, a crescer muito depressa e que está a praticar preços muito competitivos levando à preferência de muitos turistas que reservam as suas viagens nas plataformas electrónicas.

Será de esperar que este fenómeno abrande, sem se apagar, criando, num contexto de crescimento, mais espaço para os hotéis que têm, de facto, melhorado o seu desempenho financeiro.

O crescimento da receita é muito superior ao do dos hóspedes, ajudando a qualificar o destino Açores.

Os hotéis terão sempre a opção de se tornarem mais competitivos baixando preços, se quiserem.

Outro abrandamento tem a ver com os estrangeiros, enquanto os residentes nacionais mantêm-se como o motor do crescimento. Tem alguma leitura para estes números?

Os portugueses estão a descobrir os Açores e estão a vir cá ao longo de quase todo o ano, fugindo, em muitos casos, à época alta.

Este fenómeno é bom para esbater a sazonalidade. Portanto, estão a vir mais e de forma mais espalhada ao longo do ano.

Os estrangeiros têm registados quebras que podem, em parte, estar associadas ao ressurgimento de mercados concorrentes no Norte de África e Médio Oriente e, também, às irregularidades das ligações aéreas, com a falência de várias companhias que voavam para os Açores e, de forma significativa, com a não concretização da operação sazonal de Madrid para a Terceira.

São pequenos acontecimentos que vão aparecendo nas contas e não são mais expressivos porque o mercado dos Estados Unidos está em alta.

De facto, outro fenómeno, é o aumento crescente do turismo da América do Norte (EUA e Canadá), que já ultrapassa o alemão, nosso tradicional mercado estrangeiro, agora em queda. Como explica isto?

O fenómeno da quebra da Alemanha pode, como referido, ser associado ao ressurgimento de mercados que estavam em crise e ser explicado, também, com as interrupções das operações aéreas.

Este fenómeno vai tender a acentuar-se no próximo ano quando se começar a sentir o efeito de cancelamento do voo da SATA para Frankfurt.

A América do Norte, por outro lado, cresce por três razões: as ope- rações apoiadas dos Estados Unidos e Canadá para a Terceira; a continuidade e intensificação dos voos da SATA e; o efeito dos voos da Delta.

A operação da Delta parece revelar-se uma aposta ganha. Será suficiente? Devíamos apostar também numa operadora do Canadá?

Nenhuma operação deve ser considerada uma aposta ganha.

Já nos habituamos a não dar nada como um dado adquirido. A EasyJet parecia uma aposta ganha e veja-se o que aconteceu.

Não se deve deixar nada ao acaso, muito menos a continuidade de rotas aéreas. É este o enquadramento do mercado dos transportes aéreos.

É preciso trabalhar muito sob pena de, não o fazendo, apanhar-se com dissabores.

A Delta é uma operação importantíssima não só por aquilo que vale só por si, 60 a 80 mil dormidas, mas também pelo que significa de impacto de sensibilização dos norte-americanos para o mercado dos Açores.

É, claramente, uma operação com efeitos multiplicadores muito grandes e com um potencial enorme de alavancagem do nosso futuro no turismo oriundo da América do Norte.

Assim saibamos nós aproveitar a oportunidade.

Como interpreta a concentração das dormidas em S. Miguel (cerca de 70%). É demasiado?

Vimos de uma situação miserável em que os restaurantes definhavam, os hotéis faliam, o desemprego era muito elevado e as ruas estavam vazias para uma situação de um certo fulgor na época alta.

Demasiado? Nem pensar. Estamos muito longe da saturação.

A percepção de que o turismo já é demasiado vem do facto de não se ter investido o suficiente para lidar com um acréscimo de procura que ninguém esperava, em alguns locais emblemáticos de S. Miguel.

Também não se esperava uma tamanha lentidão de reação das autoridades.

As Furnas, que são ponto de visita obrigatória de quase todos os turistas – um destino só por si – mereceram apenas migalhas de investimento depois do surto de turismo. Não se compreende.

Por isso fica a sensação que já temos turistas a mais. Nada mais errado.

Teremos é infraestruturas a menos e turistas a menos nas outras ilhas. Trabalhe-se nestes aspectos.

Como analisa as quedas de outras ilhas, nomeadamente Terceira e Santa Maria?

A queda de Santa Maria só pode estar associada à má conectividade, pese embora o meio voo directo de Lisboa.

O problema está nas ligações com S. Miguel. É um velho problema que ainda está por resolver e logo na ilha que já foi o centro aeronáutico dos Açores.

A Terceira está em queda porque há uns anos atrás teve um surto de crescimento que duplicou num ano o número de dormidas, muito à custa de operações financiadas com a Alemanha e com Espanha.

Acabou o financiamento, por vicissitudes nos contratos e na ATA, caiu o nível de dormidas.

Mesmo assim, se recuarmos a 2014/15, a comparação é tão boa ou melhor do que a verificada nas outras ilhas.

Não se pode, neste caso, olhar para os números apenas de um ano para o outro.

O crescimento do Pico leva a que já tem quase o número de dormidas do Faial. O Triângulo precisa de outra acessibilidade e de outra atenção?

Diria que o Triângulo precisa de uma solução liberalizada de acessos externos e de conectividades internas que não sejam a restrição que têm sido.

O modelo de acessibilidades para o grupo central não está a permitir uma maior expressão deste destino pelas contingências que estão associadas às OSP para os voos externos e à falta de capacidade da SATA nos voos internos.

Diria que muito do que vai acontecendo no turismo das ilhas mais pequenas, Pico incluído, está a depender da conectividade interna, o que é o mesmo que dizer do mau modelo de OSP no interilhas e do desempenho insuficiente da SATA Air Açores em face de uma dinâmica de procura que não acompanha.

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