Açores

Há 100 anos a batalha era de flores

Há 100 anos a tradicional batalha de Carnaval nas ruas de Ponta Delgada era de flores. Na edição do “Diário dos Açores” dessa altura, a 1 de Março de 1919, fomos encontrar a notícia dos preparativos para a batalha, que rezava assim: “Causou o mais vivo entusiasmo no nosso meio a batalha de flores promovida pela nossa briosa académica em benefício da sua benemérita Caixa Escolar. Consta-nos que todos os carros e automóveis desta cidade estão tomados para o próximo domingo, 2 de Março, dia da batalha. São 3 as bandas de música que executarão um brilhante repertório durante a batalha, que começa ao meio dia. A academia acha-se muito reconhecida para com s. exª o sr. Almirante Dunn que gentilmente cedeu aos estudantes os grandes e pequenos ‘camions’ que serão vistosamente enfeitados e onde diversos grupos de estudantes darão à batalha o entusiasmo juvenil das suas idades. Pedem-nos para prevenir que os carros alegóricos terão entrada franca pela Avenida Roberto Ivens, carruagens, os automóveis pagarão de entrada 1$25, os cavaleiros e bicicletas pagarão $65,5 e tanto as carruagens e automóveis como os cavaleiros e ciclistas entrarão pela rua d’Esperança; os peões pagarão $12,5 de entrada. Mais uma vez felicitamos a academia pela sua iniciativa e congratulamo-nos por termos, neste jornal, aventado a ideia deste interessante divertimento carnavalesco que teve o mais entusiastico acolhimento”.

O dia da batalha

No dia 3 de Março de 1919, dia seguinte à batalha de flores, o “Diário dos Açores” relatava o evento da seguinte forma: “Posto houvesse sido organizada esta festa quasi à última hora, por assim dizer, pela nossa briosa academia, alcançou ela ainda assim um bom exito no duplo sentido a sua realização. Pouco depois da hora anunciada começou o grande entusiasmo entre as “gentis lutadoras” e os demais “combatente do entrudo” que n’alguns carros alegremente, foram à “batalha”, apenas destoando esta por algumas desformes e improprias seringas d’agua n’aquela festa de flores, “confetti” e bisnagas. Por momentos o combate entre os entrudantes atinge o delirio.

O numero de carros enfeitados, entre os quais alguns ‘camions’ da base naval americana gentilmente cedidos para aquela festa, foi relativamente grande. Sua exª o sr. almirante H. O. Dunn também ali compareceu, num automovel elegantemente ornamentado com bandeiras americanas e portuguezas, e egualmente o sr. governador civil, nosso amigo sr. dr. Francisco Luiz Tavares, ali esteve, juntamente com s. exª esposa e filhinhos, n’um carro, entrudando animadamente.

Durante esta “batalha de flores” tocaram, sucessivamente, no kiosque as bandas de musica “União Fraternal”, do Regimento de Infantaria nº 26, e da base naval americana. Foi pena ter-se transtornado o tempo por cerca das trez horas, ameaçando chuva; no entanto a batalha ainda continuou por mais de uma hora com vivo entusiasmo. A receita bruta foi de tresentos e tantos escudos. Agradecendo a amavel oferta dos bilhetes que foram enviados a esta redacção, novamente felicitamos os simpáticos promotores”.

Outra batalha em Vila Franca do Campo Noutra edição de há 100 anos, o “Diário dos Açores” dá conta de outro evento de Carnaval em Vila Franca do Campo, nos seguintes termos: “Em Vila-Franca não passou sem comentario o carnaval. A sua nota principal foi uma batalha de flores que durou toda uma tarde, bastante renhida no Largo da matriz, entre meninas da vila e arredores e os alunos do instituto vila-franquense, e um baile de máscaras muito luzido e animado. De ambas as festas foi anfitrião o sr. António J. d’Arruda que bem merece ser felicitado e encorajado para novas demonstrações de um carnaval civilisado nésta ilha, onde não escasseiam elementos de toda a ordem para festas de tal genero se efectuarem com brilho. Desejamos o carnaval despido das suas antigas brutalidades, que muitas vezes eram verdadeiras selvejarias, mas desejamos que viva, que permaneça, amoldado aos novos tempos”.

Balhata das Limas sai hoje à rua

Um século depois, a tradição da batalha mantém-se, mas as flores deram lugar à água. A investigadora Creusa Raposo, numa entrevista dada ao Diário dos Açores, recorda que a esta tradição açoriana de Carnaval “vem de um passado não muito distante e de características mais rudes e violentas”.

“Estas brincadeiras eram frequentemente mencionadas como arcaicas e brutas no século XIX e foram referenciadas por Gaspar Frutuoso através de jogos com laranjas e ovos na ilha de São Miguel. Foram condenadas e alvo de multas ao serem arremessadas contra a procissão de São Sebastião, por exemplo. Ao longo do tempo foram utilizados igualmente farinha, milho, tremoços e sobretudo água”, salientou.

“Inicialmente despejada em baldes ou alguidares, no séc. XIX a documentação faz referência à sua utilização em seringas, bisnagas e pequenos recipientes de cera com água”. A Batalha das Flores surgiu, altura, para acabar com o espírito de violência das comemorações, mas não teve sucesso, acrescentou Creusa Raposo: “Numa tentativa de desaparecimento gradual da violência, realizou-se nas três cidades principais da região a Batalha das Flores, que se caracterizava essencialmente por um desfile de carros alusivos ao Carnaval decorados por flores, mas que não se enraizou”.

“O Entrudo continuou com um cariz violento, mas diminuiu conforme as diferentes conjunturas, através de outras diversões como os desfiles de carros alegóricos”, frisou ainda.

Actualmente, em Ponta Delgada, realiza-se a Batalha das Limas, em que os “guerreiros” saem em camiões apetrechados de milhares de sacos de água para arremessarem entre si, fazendo recordar uma verdadeira batalha. Todos os anos, na Terça-feira de Carnaval, esta tradição repete-se e este ano não será excepção, sendo considerada por muitos um dos pontos altos do Carnaval nesta cidade.

Hoje, serão nove os camiões a sair à rua para a “gerra da água”, num total de oito equipas. A partir das 14h00, a Avenida Infante D. Henrique vai transformar-se num campo de batalha.

As equipas participantes são os Santa Canalha (Santa Clara), a equipa de São José (esta, com dois camiões), os Bombeiros de Ponta Delgada, Bad Boys (São Roque), Fúria Azul (Livramento), Fajã de Baixo, Rosário da Lagoa e os Mercenários (Pico das Canas – São Roque).

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